sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

Documento 1




O início das histórias dita-lhe o fim prematuro. Quando nos propomos a contar um qualquer episódio, é certo, que à partida já lhe traçámos o fim. Nada nasce por obra do acaso e nada termina sem que o fim esteja já implícito no seu início.

Não vou ser pretensioso e criar uma excepção à regra; afinal já sei o fim disto.

Tudo começou há muito tempo atrás, pelo menos assim me parece. É difícil conter as lágrimas enquanto escrevo, e afinal o que vou narrar não é assim tão triste para me abrir os sacos lacrimais.

Parênteses, a minha vida, bem como a escrita, é feita de parênteses, rectos, curvos, no fundo uma equação precoce, como outra qualquer, mas o que nos toca é sempre mais importante que o toca os outros.

Pimenta no cú dos outros para mim é refresco. Alguém me disse esta frase vezes sem conta; é assim, a nossa dor é sempre mais dolorosa que a dos outros, e não me venham cá com histórias, Compreendo, é fodido, isso passa… nós sabemos que somos egoístas, para quê disfarçar? Para quê?

Dói aqui e não é pêra doce e mais alguns chavões que não me lembro.

Era uma vez um escritor que se prendia em considerações abstractas e não desenvolvia, ele que sabia muito bem qual era o fim e início daquele segmento de recta e sadisticamente ia enrolando o novelo da realidade.

Decidiu-se a deixar de enganar as pessoas e vomitar as tripas e a alma, envolveladas em postas sumarentas de areia.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2006

José

Sr. José era aborrecido, nunca tinha feito nada de interessante, e a sua vida estava desde o início predestinada à reforma, para não fazer nada de interessante.

Todavia o Destino, neste caso revela-se, um miúdo com luvas de ciclista sem dedos, que deixa escorregar as coisas em que toca.

O sujeito em questão, José Nazaré dos Santos, nascido, crescido, vivido e aborrecido, na mui nobre cidade do Porto, trabalhou durante todos os seus dias, desde os 13 anos, na estação de Campanhã como fiel de agulha. Certificava-se que as agulhas de mudança de linha estavam em conformidade e quando alguma se avariava lá ia a correr dar-lhe o jeito. Durante o seu extraordinário e longo mandato de 52 anos, nunca houve problemas nas linhas da estação de Campanhã; recebeu três louvores de mérito e desempenho da administração da CP; aos 65 reformaram-no em conjunto com as automotoras do serviço da Linha do Minho.

Como qualquer reformado da cidade, optou pelo vasto leque de actividades que lhes estão naturalmente destinadas. Nos primeiros tempos, e como parar é morrer, dedicou-se aquilo que nunca tinha conseguido, por manifesta falta de tempo, ao ócio.

Durante algum tempo saía de casa e dirigia-se ao café da esquina, no Largo da Corujeira; dois dedos de conversa com este, uma discussão futebolística com aquele, e estava mais ou menos feito o dia.

Ao contrário de muitos dos seus colegas de reforma, José não se deixou acomodar e resolveu alargar os horizontes. Descobriu o Marquês e mais reformados que ali se reúnem para a partida de sueca, quatro jogam e trinta observam enquanto vão dando opinião, só no fim da partida porque "A sueca é um jogo de surdos e mudos".

Aprendeu com celeridade todas as regras, memorizou e aplicou os sinais, e ao fim de pouco tempo descobriu que era muito bom. Jogou durante os meses de primavera, bem agasalhado com o seu casaco da Serra da Estrela, até que o calor o deixou ficar em casa.

Cansou-se de ganhar em 93% das vezes e rumou para outros gostos e descobertas.

Desceu à Baixa e admirou as casas degradadas, achando uma pena que as coisas tenham que ficar naquele estado. Não percebendo nada do negócio imobiliário nem da política municipal de gestão do Centro Histórico, maldisse os proprietários que deixavam que se chegasse aquele ponto. No fundo amaldiçoava o criador, que deixava as pessoas envelhecer e chegar lentamente a um fim que já estava escrito desde o início dos tempos.

Imaginou quem viveu naqueles belos edifícios, quem os projectara, quanta saliva e suor foram gastos a erigir aquelas paredes, algumas já com muitos séculos. Sendo simples não atingia a amplitude do esforço ali concentrado mas imaginava uma parcela ínfima.

Perdeu-se com pormenores, a arquitectura do ferro na Rua das Flores, o Oratório da Rua dos Caldeireiros, tão bem escondido e tão deliciosamente barroco, as casas a fazer ponte sobre a Rua Arménia, aproveitando todo o espaço possível, como ele aproveitava agora todos os momentos do seu dia em detrimento dos anos que estivera a cuidar de linhas; revitalizava com espaços tão fechados, ruas tão pequenas mas tão cheias de espaço.


Nas suas deambulações subiu a rua da Picaria e, no largo, com a rua da Conceição descobre um alfarrabista, aquele que o vai fazer perder horas sem conta.

Os livros são carregados de sabedoria, mas isso é não é coisa para ele. Nunca soube ler e sempre assinou de cruz. O que lhe chamou a atenção na montra foram as fotografias espalhadas na montra; paisagens e pessoas, locais e emoções fechadas em caras desconhecidas, familiares de alguém mas não suas.

A porta abriu-se ao toque, deixando esvair um cheiro a mofo, bom, mistura alquímica de tinta papel e tempo.

Uma vez lá dentro deixou-se agarrar por todas as gravuras e ilustrações que iam espreitando por entre as pilhas de livros, e por fim pensou, que tinha encontrado a razão de tudo.

Sorriu para o senhor que estava atarefado atrás do balcão com um rolo de papel pardo, o que lhe levava a casa as talhadas de marmelada mas que aqui servia um propósito mais nobre, embrulhar cultura, preservando-a. No balcão de madeira, gasta por tanto conhecimento, alinhavam-se um corta papéis, um mata-borrão, uma caixa registradora antiga e um relógio de bolso em prata, baço como o nevoeiro.

O senhor, sorriu de volta, com uns dentes brancos para a idade, que se destacavam da pele amarelada, como se contacto com os livros lhe tivesse emprestado a cor às faces. As rugas assemelhavam-se a jornais amarfanhados sem tinta e puxavam bocados de fio para solidificar os embrulhos.

José perguntou com humildade se podia ver as fotografias que estavam na montra e foi-lhe dada uma caixa cheia de pretos, brancos e sépias. Não lhe interessava a paleta cromática, mas o que ali estava, o que podia imaginar.

Algumas fotos foram tocadas por pessoas que moraram nas casas das ruas adjacentes, pensava, e se assim não fosse, era bom imaginar e colocar aquelas personagens naqueles locais já esquecidos por muitos. Passeou os olhos por pessoas com trajes que lhe recordavam a infância, na altura em que andava descalço pelas ruas da Corujeira.

Passou tardes a escamotear, na busca de algo, ignorando que estava à procura de algo, até que um dia, como outro qualquer, reconheceu uma cara nas fotografias. De início pensou que a memória lhe estava a passar uma rasteira, mas compreendeu que não quando viu o verso da fotografia.

Uma anotação em letra corrida, feminina, revelou-lhe:

"Maria Nazaré - Largo da Corujeira, 1928."

Chorou, sem manchar a fotografia, e abençoou o fotógrafo que lhe restituiu a única imagem da mãe, de quem quase não se recordava.




Banda Sonora:
Trachimbord/ressurrection/requiem - Paul Cantelon
Edelerzi - Goran Bregovic
Lullabye - Goran Bregovic

terça-feira, 5 de dezembro de 2006

44

Quando refiro o "eles", da minha bipolar conspiração, não é por acaso que os coloco em minúsculas, afinal é o mais que merecido. Por vezes os dedos fogem-me para o "shift", mas impedem-se de o pressionar, e por eles não se deixam impressionar.
À custa desta pequena brincadeira, já arranjei uma distensão na mão.

Numa qualquer madrugada, uma epifania atropelou-me sob a forma de yogurte com pedaços, marca Pingo Doce, daqueles que vêm em frascos de vidro e concentram a fruta toda no fundo.

Tomei especial atenção ao que sucedeu, afinal não é todos os dias que temos uma revelação deste calibre.

Confidenciei-o à minha companheira que ali estava deitado ao meu lado; relutantemente sorriu e disse-me que estava a precisar de fazer uma viagem rápida de descanso; sugeriu-me Magalhães Lemos, ou uma escapadinha a Barcelos à famosa Casa Amarela.

Ignorei e declarei-me um incompreendido; continuo ciente e convencido de que sou portador de uma verdade total e declararei ao mundo, para que todos saibam, que estamos lentamente a ser subjugados, não por aliens, sociedades secretas, ou agências governamentais encapuçadas que atiram aviões contra prédios, mas sim, por algo que nos acompanha desde que nascemos e ganha terreno muito, mas muito rapidamente, sendo virtualmente indestrutível e mais algumas coisas que não me lembro neste momento.

Perdi a razão, ao que parece; os meus parágrafos tornam-se demasiado longos e ganhei um tique que me leva a mão irresistivelmente ao escroto como se um camarão me estivesse a morder os tomates aqui e ali.

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

45

Sei que a minha cura é a minha desgraça. É irónico que o que me preserva o corpo me está a destruir o espírito.

Mesmo estas palavras que agora escrevo, são concedidas para lhes fazer a vontade; não tenho garantias que isto faça parte dos planos deles, mas o mais certo é que assim seja.

Sei que a informação que contenho é por demais importante para cair no esquecimento. Custa-me escrever, porque algo dentro de mim me impede.

A verdade teima em sair, indo contra todas as formas de controlo e fico contente e triste ao mesmo tempo. Esta bipolaridade dá cabo de mim aos poucos, mas não me deixa definhar, é por isso que os admiro.

Não consigo mais guardar isto só para mim e revelarei a verdade para que cada um se possa proteger da maneira que souber.

quarta-feira, 25 de outubro de 2006

Artigo 3 Alínea b)

Art. 3, a)

- Então vais fazer uma alusão tão clara ao Wim Wenders?

- Que alusão tão clara?

- Paris não do Texas mas de França. "Paris, Texas" é um Filme do Wim Wenders!

- Deves achar que eu sei tudo, ou que faço as coisas de propósito. Isto são palavras e ideias que debito aleatoriamente. Nem eu sei o significado de aleatório, mas acho que fica bem neste contexto, lá calha.

- Tu és louco, sabias?

- Sim eu sei.

______________________________________________________

- Tens uma gralha no texto.

- Onde? Eu fiz a revisão do texto uma série de vezes.

- Olha aqui:
"e demorou muitos dias a tingir o destino."

- Isso não é uma gralha. É mesmo isso que quero dizer: tingir o Destino. Ele sabia de antemão qual era o seu mas não lhe agradava a côr, por isso resolveu tingi-lo.

- Louco!

domingo, 22 de outubro de 2006

Artigo 2 Alínea b)

fuente del peregrino
TGV a pastar... Foto do Asfaltoso


Quinino dirigiu-se então, carregado de expressões que exprimem velocidade (como "a rédeas desatadas" "espetando as esporas até fazer sangue" "lesto como o vento" e outras que tal), para Lisboa. Passou por muitas terras; separou-se de Bosford em Paris, não do Texas, mas de França, e demorou muitos dias a tingir o Destino.

Parou em Astorga. Sentou-se durante duas horas enquanto TGV pastava um feno, seco e dourado, que crescia por todo o lado.

Entretanto Bosford chegou a Amsterdão. Não quer dizer que o seu Thalys fosse mais rápido, mas não fez paragens nem apeadeiros; foi sempre em frente e chegou.

quinta-feira, 19 de outubro de 2006

Friends - Quem é amigo quem é?



The one with the chicken pox
2ª série, Episódio 23
Argumento Brown Mandell
Realização Michael Lembeck
Special guest stars: Tom Seleck and Charlie Sheen


Olhem só para o nosso Porto Ramos Pinto a correr mundo!

artigo 1, alínea b)

art. 1, a)

Nessa manhã o hirsuto mensageiro, que eles julgavam patrão, surgiu postulando a direcção da jornada. Conseguiam entendê-lo muito a custo; cuspia as palavras célere, e a piurreia em conjunto com as faixadas de porrada que levava de vez em quando, expeliam, também bocados de esmalte castanho.

Não os lavava, e no entanto eles voltavam a crescer. O ciclo dental do Hirsuto não era muito comum, e parecia que lhe era exclusivo, para poder cuspir dentes quando indicava o trajecto aos três homens.

1 levou com um perdigoto do tamanho de um pedaço de carvão e redobrou a atenção. Soou-lhe como esquerda e direita, frente e no y voltam para trás até à bifurcação x.

Uma amálgama alfabética criou-se-lhe no cérebro e as letras começaram a saltar-lhe em frente aos olhos. Hirsuto transformou-se num enorme AGÁ, e os seus companheiros num DOIS e num TRÊS.

- 1! 1 - insistiu 2.

- Parece catatónico - observou 3.

- Mas vocês prestam atenção ao que eu estou a dizer? Não tenho o dia todo - cuspiu Hirsuto.

Prestaram atenção porque o patrão não tinha o dia todo.

Ele não era o patrão, era o mensageiro.

domingo, 15 de outubro de 2006

Artigo 3 Alínea a)

Estavam a fumar drogas do peso da insustentável leveza do ser.

Não. Estavam a fumar drogas do peso da alma, aproximadamente duas dezenas de gramas mais uma.

No Brasil grama é relva, mas não era relva o que fumavam, era erva e de boa qualidade, que o cheiro que vêm destas páginas é bom.

-Também quero - diz o narrador, mas já não sobra nada.

Desloca-se ao Coffee shop mais próximo e compra um saquinho, transparente e cheiroso.

- Anacronias é que não - debita o editor - Então esta história não se passa em 1790?

- Passa, mas estou a falar do narrador, e ele pode muito bem estar no presente em Amesterdão. Eu é que sei.

- Ok, mas acho que o produto assim não vende.

... compra um saquinho transparente e cheiroso, senta-se na esplanada ao lado do Hotel, na Herengracht e fuma.

Pensa no que pode mais narrar.
Pensa!

sexta-feira, 13 de outubro de 2006

Artigo 2 alínea a)

Red Willow Riders - Valerie Graves

Anno 1790
Dois cavaleiros corriam contra o vento. As rajadas tinham 4 nós de intensidade, o que cá para nós é coisa pouca.
Um dos ginetes, de seu nome Bosford, declarou, em surdina, que a mistura com água tónica do jantar, lhe tinha caído mal no estômago.
Quinino, o seu companheiro, ouviu, através do tropel dos equídeos, algo mas não fez grande caso. Queria poucas conversas e mais velocidade; espicaçou o animal.
- Vamos Tamarindo Gnoseológico Vasconço, coragem, falta pouco para chegarmos a Lisboa.
Bosford, aborrecido por não ter a atenção de Quinino, devolveu:
- Thalys, deixemos este Alemão empertigado e rumemos a Amsterdão.

quarta-feira, 11 de outubro de 2006

artigo 1, alínea a)


Uma porta bem conhecida!


Cinco troncos de pinheiro nórdico, três pessoas e uma pedra de granito, maciça, com o tamanho aproximado de sete portas. Não sabemos muito bem se portas de gaiolas de canários, de portas de casa ou de catedral; não sabemos.

Sabemos que são precisos três homens e cinco troncos de pinheiro nórdico para mover a pedra de granito, talvez por ser maciça.

Os três homens trabalham afincadamente, há cerca de nove anos, transportando a pedra para uma direcção que lhes é transmitida todos os dias. Tanto quanto sabem, até podem estar a andar às voltas com a pedra; é perfeitamente natural que depois de um mês de direcções diárias, as voltas fiquem trocadas e voltem, não ao ponto de partida, mas a um local bem próximo deste.

terça-feira, 10 de outubro de 2006

Bom português

S5031952

Em que estadinho está a nossa língua!

Estava sossegado a ver as notícias nesse lindo canal que é a SIC, quando me deparo com uma bordoada no português que me deixou de boca aberta a descarregar impropérios.

Podia tratar-se de uma gralha, mas bem vistas as coisas...

Ora bem, estou para aqui a falar mas não desenvolvo.

A menina Conceição Lino, que admiro, não tem culpa do que o operador de teletexto escreve, e o que sucedeu é que onde se lê "Doente terminal defende eutanásia" lia-se uns segundos antes "Doente terminal defende autanásia" (!).

Mas que raio é isto? O que é a autanásia?!

Só tive pena de não ter sido lesto com a máquina fotográfica e apanhado a "gralha" a tempo.

quarta-feira, 4 de outubro de 2006

A polícia Judiciária informa:

No passado dia 3 de Outubro a tartaruga Shellie fugiu de casa nas Ilhas Galápagos e anda desaparecida desde então.

Fontes próximas da fugitiva indicaram-nos que as razões para a fuga do réptil foram os maus-tratos infligidos pelo pai. As mesmas fontes declararam que várias vezes “assisti a violentas sovas. O pai pegava num ramo de palmeira e fustigava violentamente a pobre Shellie nas costas, mas nunca na cabeça ou membros”. Declararam também que o pai nunca infringiu o código de honra que declina:”nunca batas no que pensa e no que produz” evitando bater na cabeça e nos membros.

É possível que Shellie tenha sido levada por maus caminhos, já que faz parte de um grupo radical chamado Shell Angels.

Apresenta uma tatuagem no dorso, facilmente reconhecível.

Se tiver alguma informação que nos permita conhecer o paradeiro de Shellie, não hesite em contactar-nos através dos comentários deste Blog ou pelo email.


sexta-feira, 29 de setembro de 2006

Morangos com champagne


Só tínhamos em francês


Anda toda a gente a passar-se com a Floribela ou é só impressão minha?

Uma coisa é certa, a moça é um sucesso de marketing e agrada a miúdos e graúdos, até posso estabelecer esta analogia grátis com a revista Tintin, que agradava dos 7 aos 77, mas isto já é muita fruta para o pessoal que "cola" na televisão a assistir a esse fenómenos de massas sem molho "Pesto" (FMSMP) .

Lia na revista do Expresso (já agora os meus parabéns por terem deixado o formato lençol de cama de casal) que a SIC conseguiu arranjar um antídoto para os "morangos com açúcar", e é aqui que eu quero chegar.

Os "Morangos com Açúcar" já vão na sua quarta temporada, já sem referir dos morangos de Verão. É, sem dúvida, um fenómeno de popularidade, e estou certo, que muito graças às caras bonitas e corpos reluzentes de jovens escolhidos a dedo (poucos com talento).
É claro que os FMSMP trazem algumas vantagens e desvantagens (depende do lado da barricada em que estamos).

Tenho reparado que há um expansionismo descontrolado de morangueiros por todos os metros quadrados deste rectângulo de terra a que chamámos Portugal; para todo o lado que me viro vejo os cortes de cabelo, das personagens da opera de sabão, as roupas, as atitudes, os desportos, tudo, tudo, tudo.

Confesso que no início fiquei preocupado porque temos uma geração clonada. Depois da geração rasca e outras que não me vem à memória, temos a geração morangos.
Ora bem, temos um lado positivo.

Já sabemos que há um racio positivo para os homens na proporção homem-mulher (7,5 mulheres para cada homem). Atrevo-me a dizer que o racio mudou para melhor.

Com tanto morangueiro à solta as mulheres começam a ter alguns problemas em encontrar homens de jeito. Estou a falar de homens com barba rija até aos olhos, rudes, com personalidade e acima de tudo que forneçam uma sensação de aparente segurança.

Sabemos que o sexo feminino necessita de protecção (inconscientemente) e não me venham dizer que um morangueiro é capaz disso;se fosse gaja não entregava a minha segurança a um puto de crista com a cara que parece o cú de um bébé.

E mais, é certo e sabido que comer morangos provoca aftas, por isso é que eu misturo champagne.

Tudo isto quer dizer que as raparigas não tem mais que fazer senão virar-se para os machos em vias de extinção, os agora trintões ou a caminho disso (nos quais eu me insiro).

Esta é a boa notícia do dia, a nossa coutada de caça aumentou e de que maneira; adianto que o racio já vai nas 10 para 1.

Mesmo assim continuo com saldo negativo.

P.s. Pior vai ser daqui a pouco tempo, quando todas as raparigas se começarem a vestir como a Floribela (acho que vomitava se alguém assim vestido me beijasse!)

sexta-feira, 25 de agosto de 2006

New Born (parte três)

New Born
New Born (parte dois)

- Qualquer pessoa que saiba bater com a língua nos dentes sabe disso.

- Isso é uma forma encapuçada de ironia, ou estou enganado?

- Não é uma forma de ironia, só estou a dizer que devias dar mais atenção a essas coisas. Passas a vida a queixar-te que ninguém te liga e no entanto és tu que mais contribuis para isso. A tua vida sempre foi uma maré, a única diferença é que não tem ciclos de seis horas.

- Mas isso não vem ao caso. Não era disso que estavamos a falar. Tens a mania de me interromper com essas considerações existencialistas, clínicas e dissectivas da minha personalidade e depois não consigo contar-te aquilo que me vai assombrando a existência.

- Coitadinho do menino, não o deixam falar... Essa linguagem pseudo dá-me vontade de rir. Porque não usas termos simples; porque é que passas a vida a usar palavras que são desnecessárias? Se fosses mais simplista, é provável que os teus grandes dramas se transformassem em comédia ou situações banais.

- Achas mesmo que sou assim dramático?

- Tenho a certeza absoluta. Conheço-te há tempo demais para saber disso, ou melhor, intuir. Sei que inventas estas situações para te sentires pior do que devias; pensas que assim consegues manter o cérebro activo, quando no fundo é mais simples ler Nietsche.

- Pronto, és capaz de ter razão mas como já te disse isso não interessa. Sabes quem é que me telefonou?!

- Ora deixa-me adivinhar... Não foi o Papa, nem o Bush, por isso deve ter sido uma gaja.

- Como é que adivinhaste?! Nem parece teu.

- Cala-te mas é, aliás, diz lá quem foi.

- Não é que mereças, mas ainda assim vou-te dizer: a Júlia.

- Ora bem, Júlia... Não posso, A Júlia?!

- Essa mesmo, a femme fatale, a verdadeira e única.

- Depois destes anos todos e de todas as confusões que tu arranjaste como .é que ela se lembrou de te ligar; logo agora?

- Não me perguntes porque para mim ainda é um mistério. Ligou-me ontem e, como deves imaginar, fiquei abananado. Tinha ido até à praia, a minha volta de bicicleta para descomprimir

- E deprimir.

- Para descomprimir e ela ligou. Disse que quer falar comigo.

- Só isso?

- Sim, só isso.

- Nenhum episódio rocambolesco, nenhuma cena de sangue?

- Nada. Mais nada.

- E tu não lhe ligaste de volta nem mandaste mensagens a dizer és o Amor da minha vida?

- Poupa-me a esses sarcasmos de algibeira.

- Isso ficava melhor em inglês; Pocket Sarcasm.

- Pois ficava mas mesmo assim poupa-me.

sábado, 19 de agosto de 2006

quarta-feira, 9 de agosto de 2006

sexta-feira, 23 de junho de 2006

IP'S

E sempre foi estranha a relação incontida e insuficiente que espreitava entre momentos frequentes. Sempre lhe estivera enraizada na memória a inevitabilidade da proibição da mistura laboral/amorosa.

Os dias eram agradáveis e deixavam, no entanto, algo (muito) a desejar. Olhava para ele com olhos de desejo que combatia com o misto de amoródio.

Joana-Alta, trabalhava na área das finanças. Conhecia Miguel-Moreno, como um número, mais um do rol dos trabalhadores independentes.

Estava inserido nos Livre Pensadores, tudo o que era esperado dele era que pensasse sem recurso a grilhões intelectuais. Podia muito bem ser integrado nos Pensadores Temáticos (cingidos só a um tema de pensamento), bem como nos Micro Pensadores (esmiuçavam o trabalho dos temáticos), ou então nos Pensadores Aleatórios ou brainstormers (todos os dias tinham temas diferentes de modo a que tivessem as ideias mais brilhantes).

Os Psicotécnicos indicaram-no como Livre Pensador por muitas razões sobressaindo uma, a grande quantidade de irídio no sangue.

A concentração de irídio definia a polivalência do indivíduo e Miguel-Alto, tinha-o em enormes quantidades, e não deveria ser contido nas gaiolas da obrigação.

Concentração de irídio no sangue definia possibilidades físicas fora da média, presente nos melhores desportistas.

Joana-Alta, tinha irídio na carteira, em lado nenhum do corpo, só nos acessórios, e não se interessava minimamente pelos Iridas-Positivos – a educação causara-lhe isso.

Uma anomalia financeira na folha de pagamento de Miguel-Moreno, fez com que tudo mudasse.

Amesterdão


Colares de todas as cores e feitios para alegrar as roupas e a alma.

Ainda tivemos tempo para dar umas voltinhas e com a máquina no coldre, qual cowboy qual quê, lá andámos perdidos pelas ruas de Amesterdão. Só apetece clicar a cada momento e vemos o cartão da máquina a ficar com cada vez menos espaço.

Estas fotos foram tiradas no Niewe Markt no Domingo de manhã. Vale muito a pena acordar cedo (mas não assim tão cedo - 8 da manhã e vamos a tempo) e ver as pessoas a montar as banquinhas. São todas muito simpáticas e querem é meter conversa.

Neste mercado simpático, na praça com o mesmo nome, pode-se comprar uma miríade de objectos ligados à decoração ou à cultura, como antiguidades, livros, gravuras, vinis, cd's, acessórios de moda, you name it.

Há para todos os gostos e a preços muito em conta, atrevo-me a dizer que os preços praticados são ainda mais em conta que em Portugal, com a vantagem de os holandeses gaharem mais que nós... Palavras para quê?!


É a 100 é a 100!

Gravuras e mais gravuras, desde publicidade dos anos 20 e 30, aos clássicos... As gravuras do Van Gogh são mais baratas aqui que no Rijks Museum ou no Museu dedicado ao artista, com a vantagem acrescida de estarem amarelados pelo tempo (ninguém vai acreditar que temos o original dos Girassóis, mas velhinho tem mais pinta!).




E a pracinha tem outra vantagem, fica rodeada de canais como este e com entrada directa para o Red Light District!


A entrada para o Red Light District

O Red Light não é o que todos imaginam: putas e vinho verde. No início de um dos nossos projectos conhecemos duas prostitutas que iriam servir de guias para os nossos clientes. São mulheres normalíssimas, bonitas e inteligentes; prostitutas porque gostam e não porque desgostam. Têm uma profissão como outra qualquer, com sindicato e boas condições de trabalho, e sem a hipocrisia que há nas nossas empresas. Uma mulher bonita que trabalhe numa empresa em Portugal ou em qualquer outro sítio do mundo, tem os homens a babar em cima e o objectivo a curto ou longo prazo é saltar-lhe para a cueca - o que não faz parte das suas competências. Estas ao menos sabem para o que vão.




Para um cheirinho da famosa noite de Am'Dam fica a decoração de um bar de seu nome Weber, na Museumplein, com cerveja muito barata (1,60€!) e música de ouvir e chorar por mais!




E ficam as saudades e a promessa que dia 12 de Julho lá estou outra vez!

segunda-feira, 19 de junho de 2006

Ausência

Depois de prolongada ausência, vou aqui revelar e desvelar o meu paradeiro nos últimos tempos. A trabalho, fui obrigado a rumar a climas menos quentes e nada exóticos, se bem que fantásticos.

Ligam-me para me dizer que tenho que ir para França durante algum tempo e lá vou eu de armas e bagagens para Bruxelas, onde provei algumas cervejas, Lille no dia seguinte, e depois Calais.
Andar de bicicleta e tal, para explorar a área e ficar prontinho para a chegada dos clientes.
Dieta à base de Escargot (caracóis para quem não sabe) e Moules (mexilhões de todas as formas feitios e sabores).
Depois ruma-se à Bélgica, à famosíssima colónia balnear de Oostende e fim de semana no escritório da empresa em Amesterdão, com umas voltas de bicla pela cidade como não podia deixar de ser. Não me perguntem acerca dos coffee shops que eu estava a trabalho.
Volta-se para França, Bélgica e Amesterdão outra vez e está feito.

Uma semana de descanso pró inactivo (meaning sofá e televisão) e faz-se o Caminho de Santiago a pé desde Valença em cinco dias.
Mas isso merece um pouco mais de atenção…
P.s. As fotos que estão no post anterior não têm nada a ver com a Holanda (para que conste)

domingo, 21 de maio de 2006

Ora adivinhem onde estou...

CALAIS

BOULOGNE-SUR-MER


CAP BLANC NEZ

terça-feira, 2 de maio de 2006

New born (parte dois)

O vento começa a arrepiar-me, os póros reagem e expelem os pêlos fazendo-os eriçar como pinheiros nórdicos cercados de neve. Mastigo grãos de areia finos, muito finos e olho com estranheza para os restos da minha refeição: uma casca de banana, um frasco de yogurte líquido que serve de cinzeiro ao suplemento alimentar de seu nome Marlboro.

Meio maço de tabaco em três horas de praia e a parangona de um filme "Me Myself and I"; será de um livro?! Não tenho a certeza nem Google para o comprovar. Passo.

Quatro da tarde e a irrealidade solar escalda-me as ideias convencendo-me a seguir o pequeno trilho por entre as dunas. Nada parece convincente e luto com punhais de prata contra os pensamentos que me invadem aos poucos.

Estilhaços de vida cravam-se na pele devolvendo-me à realidade. O toque de telemóvel já começa a irritar (tenho que o mudar), bem como certas pessoas circulam e circundam a minha carcaça gangrenada como mosquitos à volta de uma lâmpada demasiado luminosa. Desejo, secretamente, que o meu toque as queime, mas para já não é possível; talvez com palavras...

Atendo. Do outro lado, a uma rede nove três de distância, uma voz sobrenatural de cama disseca as palavras.

- Olá Miguel.
Respondo com estranheza e cuspe castanho, defensivo.
- Com quem estou a falar?!
- 10 anos atrás, morena, olhos verdes, perdeste a virgindade comigo.

Lembro o dia a hora, o cheiro, o cadeirão castanho, os livros no chão, a dor transmutada em prazer, a comunhão e todas as lamechices intrínsecas. Recordo o nome.

- Júlia...
- Depois de tantas ainda te lembras... Acho que fico contente com isso, afinal a primeira nunca se esquece.

A história foi complicada mas está bem fresca na minha memória. Sinto a língua entumescida com sabor a Pato Pequim.

- Confesso que me deixaste surpreendido, quase sem palavras e isso é um pouco difícil nowadays.
- Guarda as tuas palavras para depois. O que interessa é que quero ver-te, temos que conversar.

quarta-feira, 19 de abril de 2006

New born

Quando nasceste não eras bonito. Sempre disse que os recém nascidos não são bonitos e de parto natural muito menos. Eras uma bola de carne escura e não tinhas aquele cheiro bom de bebé.

Estavas amassado com a cabeça espalmada e foi estranho saber que eu tinha contribuído para te gerar. Não te consigo explicar a sensação, vais ter que passar por ela para saberes e tudo o que te estou a contar é com um alheamento de escritor, nunca com a presença emocional de um pai.

Gostei de ti desde o primeiro momento em que te vi, toquei, cheirei, exactamente como tinha acontecido com a tua mãe. À nossa volta estavam os teus avós, babados em conformidade com a situação e admiravam a continuidade genética ali deitada no berço. A enfermeira que estava a tratar de ti dizia que tinha os olhos do pai e o nariz da mãe. Eu suspirava e pensava no ridículo da situação, ninguém consegue discernir esses traços só de olhar para um ser tão pequeno, amassado e que só assume as características físicas identificadoras muito mais tarde.

Os teus olhos cinzentos reagiam à luz e pouco mais que isso, no entanto as pessoas diziam “já reconhece a mãe, olha que lindo”.

O engraçado disto tudo é que isto é tudo imaginação minha, afinal eu não estava lá para te ver nascer, para te ver crescer, não acompanhei a tua mãe e se queres saber porquê eu vou-te contar.

terça-feira, 18 de abril de 2006

as palavras que nunca Te direi

Por muito que tente nunca fiquei louco, pelo menos no cânone que rege o resto da humanidade. Sou salubremente regido por uma lei que não se aplica ao resto das pessoas. A quantidade de insanidade que me atinge seria suficiente para deitar abaixo um animal de pequeno porte, todos os humanos que convivem à minha volta, mas a mim… isto é coisa pouca, atinge de raspão e poucas marcas deixa.

Não tenho antídoto para isso, a não ser que se considere a escrita como algo incluso nesta prateleira de boticário.

Muitas vezes tentei chorar, só para saber que não tinha essa capacidade; que estava seco como um pequeno deserto, que nada brotaria da minha nascente, pouco importa. Não sou insensível nem nada que se assemelhe, sou eu igual a mim e a ninguém que conheço, no entanto não me sinto mais forte por ser assim (muito menos fraco).

Não te conhecia mas sinto que já tinha conversado milhões de vezes contigo; nunca te tinha visto mas a tua face transparece familiaridade a cada sorriso ou expressão mais carregada.

Apaixonei-me por letras tuas que aos poucos me iam preenchendo bocadinhos, lacunas que cá estavam. Desde miúdo que sempre li muito, que os meus amigos e paixões foram os livros, naqueles momentos em que me sentia mais só eles socorriam-me, os meus amigos imaginários, reais, que cheiravam a papel e ainda hoje cheiram… a recordação que tenho deles é o cheiro e o lugar na prateleira para aqueles que nunca comprei (amigos não se compram, conquistam-se) …

O mesmo se passa com as nossas relações especiais… há pessoas que nos conquistam inexplicavelmente de um dia para o outro, sem que percebamos porquê nem como: descobrimos que já conhecemos o seu cheiro como livro e que era uma história que estávamos à espera de ler.

Abrimos o livro e encontrámos palavras familiares, de uma vida que é nossa mas não é de hoje. Conheço-te não sei de onde mas reconheço-te.

Tenho força para isto e muito mais, não são só palavras escritas, são sentidas e declamadas com fogo, cor e muito vermelho e cheiro à mistura.

Ronrono só de pensar.

note that a cApital is use to emphasize a diviNity or someone similAr.

sexta-feira, 7 de abril de 2006

Biclas II


Bem me avisaram que ali havia um buraco!



Candeia que vai à frente ilumina duas vezes!

Ora bem... Na boa tradição da Páscoa, fomos ao "Lava Pés".

Mais uma voltinha de bicicleta, desta vez com mais meia hora. Comecei com uma revisão cuidada à bicla e depois vamos lá que se faz tarde. Fomos mais numa onda de vamos por aqui a ver o que isto dá.

Chegámos ao rio Neiva e aconteceu o primeiro percalço: Asfalto na água (até tive medo que fosse com a enxurrada). - Consultar imagem 1.

Pude exercitar a minha expressão favorita: "Eu bem te avisei".

Mais ou menos 45 minutos depois, ia eu à frente e resolvi arriscar tudo e meter-me no lago: toca a espremer as meias e rir. - Consultar imagem 2

Entretanto planeámos uma coisa mais extensa, ir até Vila Verde, a muitos quilómetros da nossa "home base" e vir por aí abaixo a ver as azenhas.

É que é sempre bom ver o que de bonito temos por cá, até nos esquecemos de alguns ex libris.

Conclusão, vamos tentar andar de bicla várias vezes por semana e sobreviver com os pés secos.
Inscrições para futuras cirandagens aqui ou aqui.

A foto relativa ao NoAsfalto foi censurada por vontade do protagonista.

quarta-feira, 5 de abril de 2006

Biclas

Ora bem, o bom tempo voltou, por uns momentos, e com ele a vontade de fazer exercício. Eu e o companheiro No Asfalto, já nos vamos queixando da falta de combustão nos músculos e resolvemos pegar nas biclas e fazer-nos à estrada e ao monte.

Isto tem muito que se diga, nem é assim tão fácil como isso, e quando estamos com meio pé nos 30 as coisas deixam de ser como eram.

Havia duas alternativas de percurso, a subir ou a descer; é claro que escolhemos a subir porque no fim quando estamos mais cansados é sempre a descer e como a neste sentido todo o panteão dos canonizados ajuda, lá fomos.

800 metros depois, os pulmões, e o coração rebentavam e fizemos a primeira paragem com imprecações como "porque raio é que não vivemos na Holanda ou em Barcelona", "porque é que não há descidas nesta p#$% desta terra!".

Até há uns tempos atrás podíamos estar imenso tempo sem fazer exercício que tudo estava bem, pegávamos na bicla como se não fosse nada, agora a idade, o tabaco e o castrol pesam e de que maneira.

Já mais lá para a frente, dois ou três quilometros depois, começámos a descer e aí começou a diversão, saltos, solavancos e muita muita lama. Feliz ideia a minha de levar t-shirt branca, ficou castanha!

Quando erámos miúdos levávamos uma rabecada das mamãs por chegar todos enlameados a casa e agora elas até acham piada. É uma das vantagens da idade, poder fazer o que fazíamos em putos sem queixas ou recriminações das progenitoras.
Conclusão filosófica possível: na altura não havia máquinas de lavar roupa aos pontapés.

Depois desta reflexão, cheguei à conclusão que devo comprar uma bicicleta nova, o pedal direito não está nada saudável, ameaça sair a cada pedalada.

Fotografias tiradas ao depois da aventura, e toca a descer para o ponto de partida numa descida vertiginosa e convidativa à velocidade.
Uma hora depois da saída lá estávamos nós no tasco a beber uma água e a desgarrar mais alguns elementos castrólicos para a próxima voltinha que será um dia destes, quando não nos lembramos das dores no corpo.

Quem disse que a vida saudável era boa estava enganado.
Duas cervejas para a mesa 1 por favor!

Números:
15 km's mais ou menos;
10 fotografias;
7 paragens;
95 subidas, uma recta e 3 descidas;
7425 solavancos;
23 apertanços no pedal;
453672 salpicos de lama na roupa e na boca;
1 hora em cima da bicla.

segunda-feira, 3 de abril de 2006

1º caso de Gripe das Aves no Norte!

Miguel de Terceleiros - Correspondente.

Sexta-Feira passada a pacata Vila de Forjães, concelho de Esposende, acordou em sobressalto, quando uma galinha apareceu morta em circunstâncias algo suspeitas.

O espécime foi encontrado com uma corda ao pescoço pendurada na porta Norte da Igreja da referida Vila.
Uma missiva foi encontrada horas depois na tarimba da vítima dizendo o seguinte:

Adeus mundo cruel. Descobri agora que tenho a Vogel Grip (que é como quem diz gripe das aves) e vou pôr termo à minha vida.

A equipa do CSI - Vila Chã entrou em campo e reconstituiu o crime. "A vítima dirigiu-se à igreja para receber os últimos sacramentos e vendo a porta fechada resolveu enforcar-se ali mesmo. Ainda andámos à procura do cúmplice, porque uma galinha não se consegue enforcar sem ajuda." comentou José Batana, o criminalista de serviço.

Fontes próximas da vítima declararam que esta ficou inconsolável quando lhe foi diagnosticada a terrível doença.

Estão afastadas, para já, todas as suspeitas de uma cabala relacionada com queijos limianos e um grupo terrorista chamado Hamens.

quinta-feira, 23 de março de 2006

Catalunha I

Voltei finalmente. Cansado, muito cansado para não dizer esgotado. Foi uma vida muito dura, ter que conhecer sítios lindos e ser pago para isso. O que me cansou foi o horário de trabalho e os quilómetros que andei.
Para abrir o apetite, ficam algumas fotos dos Pirinéus e arredores, que as de Barcelona ainda andam à deriva.

Casas de Posada, neste caso as Casas Altas, junto a uma albufeira linda de morrer, muito perto de Sant Llorenç de Morunys; vila que esteve sobre a alçada dos monges de Montserrat, aquele mosteiro encaixado na rocha, qual Alamuth qual quê, que se vê quando se toma a estrada para Barcelona, proveniente de França.

Tuxiént: pueblo perdido no meio das montanhas, no início da Serra de Cadí, onde as pessoas ainda guardam inimizades da Guerra Civil, bem como um catalão cerrado, incompreensível e umas expressões deliciosas "Què sè se entrenava no podria ser mas tonto" - alusão a um menino da nossa equipa que era ditador até ao tutano.

Cal de Jovell: mais um pueblo simpático sem vivalma, encaixado nas entranhas de Cadí.

El Parador de La Seu d'Urgell: Hotel de 4 estrelas, de Design, fugindo um pouco à austeridade do Grupo Parador, que escolhe castelos e afins para fazer as delícias dos seus hóspedes. Neste caso só resta um claustro que dá um ambiente esquizofrénico, aliando a tradição à contemporaneidade.
Para que conste o meu quarto até Jacuzzi tinha, azares da profissão.

Hotel Riberies - Llavorsi: o melhor atendimento do planeta e arredores. Cozinha de fusão (francesa e catalã) , uma carta de vinhos fantástica (recomendo qualquer um dos Penedês) e o melhor pequeno almoço que já tive na minha vida (15 tipos de queijos, todo o tipo de fruta do mundo - fresquinha - sumos naturais à escolha e um cozinheiro disponível para satisfazer os nossos desejos na hora).
O melhor foi o preço... Jantar, dormida, pequeno almoço e uma cama de 2,5 x 2,5 m... 70 €!

Gerri de la Sal: pueblo de exploração mineira, muito perto de Andorra e de uma estância de ski bem conhecida, Espot (good espot for ski). Palavras para quê?

La Seu d'Urgell com a Serra de Cadí ao Fundo...
Mais informações nos próximos dias.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2006

Catalunha!

Casa dos meus pais, 11 da manhã, hoje.

Toca-me o telefone e vejo o toque mágico das holandas:

- Hello Ricardo, this is Miranne from (empresa que não posso dizer o nome).
Eu já sabia que me ia ligar, era uma questão de tempo. Tínhamos que combinar os detalhes para o trabalho que se avizinha.
- Olha, já cá tenho os teus dados para marcar o voo para Barcelona, só me falta mesmo saber de onde queres voar.
- De Copenhaga, pode ser?
- Copenhaga, estás em Copenhaga?
- Claro que não! Sabes muito bem que voo sempre do Porto, não percebo é porque me estás a fazer essa pergunta.
- Desculpa, foi mesmo uma pergunta estúpida.


Bem, o que é certo é que na terça-feira de manhã tenho um voo marcado para Barcelona e vou estar um mês sem poder actualizar este panegírico de realidades alternativas.

Mais ainda, façam o favor de não me enviar mails que eu não respondo; para onde vou não tenho acesso à internet, por isso até à minha volta cerca de 18 de Março.

O Senhor Gaudêncio que se cuide



Até à minha volta!

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2006

5

A pedido da Rita (encravaste-me!)

5 Traços de Personalidade (Nem sei se tenho isto)

1 - Sou completamente impulsivo (se me apetecer tirar a roupa toda no Sudoeste é isso que faço!)
2 - Sou louco (Para escrever as coisas que escrevo só posso ser)
3 - Sincero (quando posso e me deixam - Não gosto nada que me convidem para cadeias!)
4 - Carinhoso para quem merece FDP para quem merece!
5 - Esquizofrénico assumido (as pessoas não sabem se devem rir ou chorar com as coisas que digo)

5 Hábitos estranhos

1 - Enrolar a pratinha do tabaco com o plástico - Sempre!
2 - Acordar a resmungar (quando não acompanhado pela companhia certa)
3 - Beber sempre cerveja pela garrafa (à trolha!)
4 - Insistir em ter objectos que não funcionam (como o meu Zippo)
5 - Alinhar em cenas de cadeia embora choquem com a minha religião!

5 desgraçados a quem vou passar isto:

Posso ficar cem anos sem dar uma mas não passo a ninguém!

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2006

Portugal em Coma Profundo #2 O Comboio

Sempre gostei de viajar de comboio. Os outros transportes públicos fazem-me confusão mas o Quim deixa-me à vontade.

Tem espaço para as pernas (os autocarros são feitos para anões, eu com o meu metro e oitenta e um vejo-me desgraçado para caber naquele espaço), dá para esticar as pernas, para ler, para fumar um cigarro (já deu, agora é proibido) e não há perigo de um qualquer condutor provocar um acidente, afinal é só manter a máquina dentro dos carris.

Podemos conhecer montes de pessoas, é muito fácil, em especial naqueles que tem os bancos virados uns para os outros. Olha-se com interesse para a pessoa da frente, diz-se “ah e tal parece que vai chover” e passado pouco já se arranjou companhia.

Há uma espécie que é indissociável dos comboios, devido às tarifas reduzidas, os militares, vulgo “tropas”. Pelas histórias que ouço do meu pai (que foi paraquedista) no tempo dele é que era: porrada entre marinha e paraquedistas, feijões verdes (infantaria), era uma festa. Até combinavam. Agora hoje…

Já há uns anos que viajo de comboio e há coisas que não mudam. Os militares são uma coisa à parte. Andam sempre em rebanho, carregados de tralha e onde entram acabam logo com o sossego do resto das pessoas.

Sempre acreditei que só os cristãos novos é que podiam ir para a tropa porque afinal tem todos nomes de objectos. Tratam-se todos pelo apelido Oliveira, Castanheira, Silva, Laranjeira, Fogareiro. Nunca conheci nenhum tropa chamado Telles de Menezes, Marialva, Alenquer, o que me faz pensar que só a raia miúda é que vai cumprir o serviço militar. Os mancebos com nome mais elaborado vão logo para oficiais. Tenho a secreta certeza que é para não melindrar os instrutores.

Olhem lá se eu fosse para a tropa, dois minutos depois estava toda a gente a rir-se à gargalhada com as tentativas frustradas do senhor instrutor dizer o meu nome:

- Ó Treceleirus!
- Terceleiros meu primeiro.
- Ou isso.
Já para não falar dos serviços administrativos (ehehehehhe).

Outra coisa que me faz confusão: “Sim meu primeiro”. Primeiro quê? O primeiro a comer na cantina, o primeiro a mandar toda a gente fazer 3564 flexões?! Não percebo.

Também se dedicam a insultar e a ameaçar os superiores lá da caserna:
“Se apanho o sargento Tainha num canto escuro limpo-lhe o sebo, aquele filho da puta!”. Tudo em vão, parece que faz parte da cartilha dos recos.

A idade conta, estão naquela fase em que as hormonas começam a ficar irrequietas, graças a isto, têm a genitália muito perto da boca e cá vai aço. Uma rapariga que se encontre entre os 15 e os 30 e poucos é logo alvo de uma tentativa de graça (invariavelmente é desgraça), cá vem o galanteio fácil. Atrevo-me a dizer mais, basta ser uma mulher para os senhores se porem logo com coisas. Se por acaso a menina tiver uma saia com uma racha mais perto da homónima, a hipótese da qualidade e quantidade de bocas, centuplica. Note-se que é neste momento que estes senhores se parecem mais com lobos, atacam sempre em alcateia, um sozinho não se atreve a abrir a boca.

A seguir vem a praga dos telemóveis. Sempre que sai um modelo novo, lá vem eles comparar, toques, wallpapers, fotografias, enfim tudo. O militar é especialmente apto em relação a este tipo de equipamento. Conhecem tão bem todas as suas funcionalidades como conhecem a sua G3. Estou convencido que eles são os principais e únicos clientes dos 3939, 4002 e 6969.
“Envia ração de combate para o 4343 e receberás wallpapers camuflados no teu telemóvel”.

O tempo faz com que as coisas mudem um pouco. A nova moda são os computadores portáteis. De início é comprado para descarregar as fotos 41x41 pixel do telemóvel. Depois começam a comprar acessórios, pen drive, microfone, impressora, rato sem fios, gravador externo de DVD, placa wireless de infravermelhos para não usar cabos a passar as fotos… You name it!
Tudo isto é patrocinado pelo finório lá do quartel, o primeiro-cabo Azevinho, que só não vende a mãe porque ainda não encontrou o recibo.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2006

Rua 5

E foram pacientes até que não se contiveram mais. Passavam a noite a produzir o amor e a manhã a discutir o que iam lendo. Ele alimentava-a com o que ia escrevendo e ela alimentava-lhe a inspiração com o que sentia. Ela chamava-lhe Garfield, porque só comia, dormia e escrevia. Raras eram a vezes que saía de casa. Os textos para a revista da faculdade mandava-os por Email, o tabaco chegava-lhe a casa pelas mãos dela e o amor compelia-o a fazer exercício, o melhor dos exercícios.

Passavam a vida a rir e eram felizes com a vida que tinham.

Ela gabava-lhe a inteligência e ele gabava-lhe o corpo. Valera a pena a espera, o troféu por que tanto esperara estava ali nos seus braços, para sempre, pelo menos julgava ele. Mas o ser humano é um ser muito estranho e toda aquela felicidade começou a fazer-lhe confusão. Voltou aos seus antigos contactos e começou a sair à noite.

Na altura o Grupo frequentava um dos mais conhecidos tascos da cidade.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2006

Rua 4

- Eu? - Seguira a história com um brilho crescente nos olhos e percebera que a história que lhe estava a ser declamada por aquele gigante moreno, tinha algo a ver com ela. As suas histórias já se haviam cruzado numa das encruzilhadas do Destino.
- Minha doce Rita… se soubesses quantas vezes sonhei contigo e qual teria sido o teu percurso… Sonhei milhares de vezes com o teu sorriso, com a tua cara e as palavras a brotarem dos teus lábios em torrentes contínuas de sentimentos que me atingiam no eixo do coração.
Sonhei, escrevi, descrevi idealizei-te e aqui estás, sem dúvida muito melhor que o produto da minha imaginação, porque és de carne e osso e não um sonho que quando acaba nunca é retomado como querias porque não tens controle sobre o teu inconsciente…
- Nunca pensei que podia despertar paixões deste tipo… Nunca ninguém me tinha dito o que disseste de uma forma tão apaixonada como tu. De qualquer das formas também eu perdi o contacto contigo Miguel, gostava de voltar a conhecer-te com o risco implícito que corremos, que é conhecer um homem e não um miúdo. A alegria do reencontro pode envenenar-nos mas vamos com calma. Do futuro ainda ninguém mandou cartas por isso vamos ser pacientes.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2006

Rua 3

Vem daqui

Estivera tempo demais à espera daquele momento, mas calibrava as emoções para não correr o risco de parecer precipitado.

- Tudo isto te pode parecer demasiado estranho, mas acredita que no momento em que te vi a sorrir para mim naquele pálido reflexo do que eu sou, toda uma série de recordações de como seria ou como será me assolou como uma avalanche de sentimentos descontínuos mas acima de tudo coerentes.

Deve ser confuso para ti que um homem a quem ministras casualmente um curativo, se apresente à tua frente como o maior dos apaixonados sem nunca sequer lhe teres posto a vista em cima.

Há muitos anos atrás conheci uma rapariga que se tornou no primeiro amor platónico da minha vida, tinha eu então uma idade muito tenra para perceber os meandros da produção do Amor.
Assim como entrou na minha vida saiu, devagar e com calma mas ao mesmo tempo de chofre. Perguntei-me várias vezes o que seria feito dela e não consegui ter resposta, e concerteza que também não fiz o esforço que deveria e que faria hoje em dia para atingir um objectivo, enfim… maturidade.

Quando menos se procura mais se encontra, e foi o que aconteceu, ainda bem. Num momento em que eu já não tinha na ideia encontrar-te aqui estás tu.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2006

Rua 2

A noite caiu e o dia entrou-lhe pela alma sem pedir licença. A sua natureza noctívaga rejubilou com a ausência do sol. Estava sentado há tempo sem conta à porta da loja. O passeio gelara-lhe os glúteos, mantendo-se desperto em considerações várias sobre aqueles olhos verde pinheiro nórdico que lhe trespassaram a alma.
Sete e um quarto. Com passo seguro saiu pavoneando com simplicidade o corpo bem feito, mas não demais, que corava de inveja devido aos olhos que comandavam toda a mole de carne com energia categórica.
Miguel cortou-lhe o caminho e agradeceu o curativo feito há horas sem conta.
- Gostas de surpresas?
- Sim. Testa-me - e sorriu.
Minutos e poucas palavras depois, um empregado com um impecável avental/macacão azul-escuro dirigiu-se-lhes com uma bandeja carregada com o esplendor de dois cálices âmbar de Vinho do Porto.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2006

Rua


"La Rue Mosnier aux Paveurs" Manet.

Nessa tarde foi para a sua costumeira esplanada e o Destino quis que algo de insólito lhe acontecesse. Estava havia já duas horas repartindo o tempo entre a leitura de “Viver para contá-la” de Garcia Marquez e as suas anotações esporádicas no seu Moleskine, oferecido por uma amante sazonal. A ansiedade mental divergia-lhe, com matreirice, a atenção para a plateia do proscénio.

Ia atentando a todas as pessoas e imaginava as razões ocultas que as faziam permanecer, como figurantes de uma ópera, habituadas ao som e à imagem mas permanecendo porque realmente ali tinham que estar para compor o cenário.

Fartou-se daquela estaticidade, levantou-se em direcção a um objectivo que não discernia mas lhe parecia melhor que a falta de inspiração que lhe transcorria a mente. Deu dois passos e uma das enormes janelas do terceiro andar caiu no sítio onde estivera sentado. Ficou branco e afastou-se alheio à reacção das pessoas que lhe diziam que era um homem de sorte.

Parou para reparar que sangrava da face. Um estilhaço de vidro fixara-se abaixo do olho direito, a dor aguda fê-lo praguejar. Com a ajuda do reflexo de uma montra retirou-o. Dentro da loja uma rapariga olhava-a com o reconhecimento estampado no sorriso. Saiu e perguntou se estava bem.

terça-feira, 24 de janeiro de 2006

A Galeria

Recortes esparsos, descritivos da realidade ali vivida por uns e outros boémios da cidade, estavam afixados com cola branca nas paredes.
O dono, mais uma personagem característica daquela zona ribeirinha, com o seu penteado estilo ponte, - a careca era coberta pelos fios de cabelo resistentes do lado esquerdo e faziam a ponte para o lado direito da cabeça, cobrindo de uma forma cómica a calvície que não alastraria mais – recebia com simpatia os boémios universitários. Vendia vinho a copo atraindo assim todos os apreciadores de vinho a martelo, jovens. Conseguira manter uma resistência tácita aos velhos bêbados, tarefa hercúlea mas conseguida e, a sua clientela cingia-se aos jovens universitários, bem-educados, pensantes e falantes.
Do que ele gostava era de ter os seus meninos a dar brilho à casa. Vendia também traçadinhos (anis com bagaço), ginginhas (licor de ginja) e Eduardinhos, segredo da casa. Bebia-se com gosto e pelo barato.
A sua esposa, sentada sempre no seu cadeirão de veludo, era conhecida como a Madrinha, todos os que lá entravam tinham que a cumprimentar com dois beijos e pedir-lhe a bênção. Quando soube do epíteto que os boémios lhe haviam dado “os marotos dos rapazes” entrou no jogo e começou a dar-lhes o folar todas as Páscoas, um traçadinho por cabeça. É claro que interpretou mal a analogia que se fazia com Don Corleone de Scorcese, mas era a sua simplicidade a falar.
Miguel, depois de inserido naquele microcosmos, pediu um dia aos senhores que lhe deixassem escrever, numa parede vazia, um conto sobre aquele tasco. Com o apoio do Grupo lá os convenceram e lá foi escrita, a marcador a álcool, uma história sobre que lá passava. Tornou-se tradição e uns meses depois o negócio aumentou. Pintores, escritores e fotógrafos deixaram lá a sua marca e o tasco transformou-se num espaço de exposição e mudou o nome para A Galeria.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2006

Sei lá

O tempo está nublado e o sol que vai permeando os flocos de algodão no céu, ilumina algumas zonas do bosque dando-lhe uma coloração esquizofrénica, matizando as várias árvores de cores que não são de todo reais.

Os carvalhos, azinheiras, castanheiros e sobreiros, pejam o solo com as folhas douradas, reticuladas, caídas do Outono; estão húmidas e sentes a pontada familiar do reumático no joelho. Já estavas a precisar de espairecer e sempre soubeste que este sítio estranho, que transpira algo que não identificas, te deixa sempre mais tranquilo.

O mar está ali a cinquenta metros, sentes o sal na boca, o cheiro da maresia e o que mais te agrada, o som das ondas a bater nas rochas. Desde muito novo que vens aqui e patilhas os teus segredos com o mar e com a terra, invocando um velho rito pagão de partilha com os elementos. Há uns anos conseguiste conjugar o que te faltava.

Tiras um cigarro e lambes a superfície. Não é a primeira, nem será a última vez, juntas a pedra já queimada, minutos depois, invocas o fogo.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2006

Homens com problemas de nomenclatura

A esplanada está cheia de pessoas a comer areia. Há pouco alguém mandou um chuto no areal, quando o vento ainda estava calmo e acabou por provocar esta algazarra de sílica voadora.

Tudo estava a correr muito bem. O dia bonito, o almoço saboroso, algumas lágrimas de ressaca, teimosas, a querer sair e um belo dia de praia a perspectivar-se. Miguel chega e dá um pontapé na areia e de um minuto para o outro, sem pré-aviso nem carta registada, o bom tempo despede-se e lá vem a ventania.

- Isto passa, diz Hugo com areia a invadir os seus caracóis, já de si revoltos, que de preto passam a loiro com tanta areia que o fustiga.

Pepe nem precisa de convite, deita-se sem tirar a roupa, cobre-se com a toalha e agarra-se à ressaca para dormir uns vinte minutos que sejam. Hugo abana a cabeça e ri-se da posição que Pepe arranjou; Miguel gargalha.

- Só mesmo ele para dormir nestas condições.

Dois minutos de sono e já tem a cara com areia por todo o lado; Hugo enquanto vai trincado alguma informa:

- Acho que provocaste aqui uma revolução. Aquele chuto que deste perturbou os camaridinhos e agora estamos fodidos.

- Ando eu a perturbar este microcosmos sem necessidade nenhuma. Olha se tivesse dado um chuto num penedo, aí é que estávamos fodidos.

Armaram a tenda à canadiana e foram-se rindo até que a situação se tornou incomportável; a areia fina invadira tudo e Pepe acordou a cuspir que já tinha areia nas pregas dos sacos, o que bastou para se porem a caminho para ambientes mais livres de particularidades.

Como eu estava a dizer ali em cima: a esplanada está cheia de pessoas a comer areia, por isso vou mandar estes três senhores para dentro do bar, não há cá esplanada para ninguém.

Estamos em Caminha, mais em concreto, na praia do Camarido, com vista para a Galiza e para o estuário do rio Minho que se permeia com o mar já ali, uns metros à frente. Estão os três acampados no parque já bem conhecido, com muitas histórias para contar a quem as quiser escutar, e agora querem qualquer coisa para molhar o bico de caçadores insaciáveis.

Sentam-se e pousam todas as tralhas na mesa, nas cadeiras, trazendo o pandemónio do exterior em forma de objectos.

- Lembrei-me agora de um sketch para o Gato Fedorento… - diz Miguel enquanto se engasga com a Super Bock e com o riso – Homens com problemas de nomenclatura!

- Ora explica lá isso – ri-se Pepe com as suas características gargalhadas mudas.

- Já vais ver.

Miguel faz sinal à empregada, moça dos seus vinte e muito poucos anos, que deve muito à beleza e nada à simpatia. Aponta para a garrafa vazia, ela entende o que bem entende e dirige-se ao balcão.

- Sempre com sede caralho.

Pepe é lento como mel a escorrer pelo vidro, era bom para ir buscar a morte, e às vezes há um lampejo de espanto quando vê Miguel e Hugo a emborcar cerveja.

A rapariga chega com uma Super acabada de abrir.

- Desculpe… - Diz Miguel quando ela já deu meia volta – Eu só queria que visse que a minha garrafa estava vazia.

As faces da rapariga passam por toda a paleta cromática do photoshop e diz timidamente:

- Desculpe… mas… eu pensei que queria outra.

- Estava a brincar! Deixe ficar.

Miguel ri-se e a rapariga suspira de alívio. Afasta-se e Hugo comenta:

- És fodido…

- Estava só a brincar, e não me parece que ela tenha ficado chateada.

- Olha, mas que raio é que isto tem a ver com os homens com problemas de nomenclatura?

- Esqueci-me disso… já sabes que as minhas ressacas são assim, dá-me assim umas brancas; mas já te mostro.

Passados dois minutos a rapariga volta a cirandar ali perto e Miguel volta ao ataque:

- Desculpe!?

- Sim – a voz dela denuncia insegurança, como se Miguel lhe fosse fazer um pedido difícil.

- Olhe menina… Eu quero uma coisa mas não me lembro do nome.

- Sabe é que ele tem problemas de nomenclatura – Pepe resolve, com o seu ar sério e neutro, deitar algumas achas para a fogueira.

- Nomencla quê?

- Nomenclatura: por vezes não consegue dar nomes às coisas… Não se lembra dos nomes.

- Bem, eu quero (não sei como se chama)… é um líquido meio castanho, quase preto; geralmente vem dentro de um recipiente branco, com desenhos ou letras por fora, em cima de um disco branco, e depois vêm acompanhado por um invólucro colorido que pode ser de papel ou plástico com uns grãos brancos no interior, que misturados com o líquido o tornam doce.

- Café – Pergunta a rapariga a medo.

- É isso mesmo, enfim, alguém que me compreende!

Ela retira-se na demanda do líquido blá bá blá, e os três ficam a rir-se.

terça-feira, 17 de janeiro de 2006

Untitled

Ninguém tem o mapa que indica o caminho, este tem que ser trilhado de uma forma muito própria e bem ou mal o teu tinha sido bem calcorreado, até hoje.
As dúvidas voltam e desta vez com uma dimensão própria da idade, com todas as consequências, mais importante ainda, com todas as causas, frutos do teu livre arbítrio.
Nunca ninguém disse que era fácil viver, mas rápido se chega à conclusão que é bem mais difícil sobreviver.
A rua está iluminada, e a escuridão amarela dos lampiões entra-te pelos olhos cegando-os. Sentes a alma negra e cáustica e, olhando à volta, sabes exactamente o passo que vais dar a seguir.

Não tens medo e orgulhas-te, peito inchado, de nunca o teres sentido. À nascença retiraram-te esse sentimento, nunca to deram. Ficaste isento desse mal que nos corrói a todos, os humanos, e por consequência nunca foste cobarde.
Quando miúdo não medias as consequências dos teus actos. Trepavas sempre à árvore mais alta, galgavas o fosso mais largo, transpunhas todos os obstáculos porque sabias que conseguias, tudo por não teres medo. Nos testes ias carregado de confiança, era indiferente que tirasses boa ou má nota, porque não tinhas medo.
Agora estás aqui à espera. O orgulho já se misturou com a auto-confiança, sabes que podes fazer tudo.
O cemitério é igual a muitos que viste durante a tua vida. Já viste muitas lágrimas e verteste-as tu próprio. Este está aberto vinte e quatro horas por dia, as pessoas tem a oportunidade de ver os Seus no momento em que desejarem, pelo menos a campa marmórea, branca, cinza ou granítica, fria. Não a quentura dos corpos antes do rigor, mas o frio para lembrar os visitantes que o ente querido nunca mais terá sangue quente, rápido a correr-lhe nas veias.
As grades, de ferro forjado em forma de setas estilizadas, elevam-se ameaçadoras aos céus, como que apontado o caminho aos jacentes. A lua oferece-te uma perspectiva fantasmagórica do ambiente, com a luz a incidir em tons de azul, mostrando a amálgama de cores dos túmulos.
“Carlos da Silva Santos – nascido a 23 de Junho de1933, falecido a 26 de Agosto de 1966.”
Trinta e três anos, a idade que se presume Cristo teria quando desfaleceu na cruz.
É aqui o local indicado. Acendes um cigarro ao mesmo tempo que ouves passos à tua direita. Viras a cabeça e nada vês. Apuras o ouvido naquela direcção e identificas a sua proveniência, mas lá não está ninguém. O som é de passos numa superfície com areia. O raspar é característico e em relação aos sons é raro enganares-te. Outra pessoa começaria a correr daí para fora, mas o teu medo, que não existe, deixa-te investigar.
Os passos, por estranho que pareça, continuam no mesmo sítio, e tanto quanto te é dado a entender, soam a uma marcha de pés invisíveis no mesmo local.
À medida que te aproximas o som está mais nítido; quase que ameaçador. Localizas a origem do som: uma torneira pinga sobre uma garrafa de plástico produzindo o ruído que te chamou a atenção. Ris e voltas-te em direcção ao teu posto de espera e, com surpresa, vês uma figura branca no sítio onde estavas; aproximas-te.
- Obrigado por ter vindo, especialmente nestas condições.
Um sorriso rasga-se no rosto do desconhecido, com uns lábios carnudos que se tornam finos dada a amplitude da abertura; se fosse mulher quando sorrisse pintava as orelhas com batôn.
- Meu caro, sabe que a curiosidade é um dos meus piores defeitos…
Estudas o teu interlocutor: veste um fato branco de linho, uma camisa simples do mesmo material, sapatos de sarja da mesma cor; a cara é estranhamente morena, encimada por fios de cabelo alvos como a neve; os olhos saltam à vista de um azul água que encovam naquela tez escura. Figura estranha, transpira decisão e serenidade.
- Não sei se será um defeito. Estou certo que já foi recompensado por seguir essa curiosidade.
- Não está longe da verdade, mas também já sofri alguns desaires, por isso lhe chamo defeito.
- Tudo o que é em excesso é um defeito em potência, pecamos sempre por excesso ou defeito, é irónico.
Apetece-te avançar na conversa e no que proporcionou o encontro; as palavras do homem de branco envolvem-te.
- Cá estamos nós no sítio onde tudo acaba e começa. Já sei que não é muito dado à metafísica mas eu acredito que aqui começa muita coisa, por isso o convidei para cá vir.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2006

Gatos


"A pair of Boots" Van Gogh - 1887

De manhã esteve sol. A informação não é grande coisa e pode até ser desnecessária, mas para quem não vai ler isto hoje fica como memória. Neste momento está um frio misturado com vento que me faz rebentar os lábios e me provoca dores nas costas, das tremuras que me percorrem aleatórias mas mordazes.

Nem sei como ainda consigo escrever, os dedos não articulam e tenho a sensação de que não tarda e se vão quebrar como cristal falsificado.

O coração, esse, está quente, com uma energia renovada, não me perguntem porquê, porque a minha boca está selada, excepto para sabores.

Tenho os pés gelados, e não é costume.

Encosto o meu caderninho e resolvo ir para casa, já tenho as nádegas congeladas e em o aquecimento central está a ser desperdiçado com os gatos.

Entro e está o macho deitado no sofá. Espraiado a deixar o cheiro espalhado por todo o lado. Ronrona e vai-se mexendo a convidar a gata que por ali passeia. Ela move-se com elegância e aproxima-se com os olhos semicerrados num sorriso felino: trepa ao sofá e aninha-se junto ao gato. Fareja-o junto ao pescoço e posso jurar que ele se arrepiou, vejo o pêlo a eriçar-se mas, tanto quanto eu sei os gatos não se arrepiam.

Ela reconhece o padrão e deita-se enrolada com o seu corpo a encaixar na perfeição no dele. Ele ronrona de satisfação e aceita o que ela tem para lhe dar.

Se os gatos dessem beijos com as suas bocas pequeninas com língua de lixa, tenho a certeza que estes dois se iam entender muito bem; a forma como se olham, é estranha para felinos, decidida e sensual, aliás como o andar atlético e sinuoso.

Há cheiros que são compatíveis, que provocam a química, que ficam registados no cérebro, acho até que a melhor palavra para isso é anglófona: “imprint”. Somos animais e isto faz parte.
O sabor também indica esta compatibilidade, e o beijo é a forma de se saber isso. Beijo sem língua é como aletria sem canela, como lays sem sal. A língua transmite-nos o sabor da outra pessoa, e não importa que seja fumadora, ou que tenho comido isto e aquilo, há ali um elemento qualquer que se encaixa com o nosso padrão, que se encaixa no nosso padrão.

Olho para os gatos e sei que estão felizes naquele sofá, não os vou incomodar, vou deixá-los com aquele amor de gato, humor de gato, sexo de gato. Para lhes dar privacidade ponho-lhes um cobertor felpudo por cima.

Não se queixam, nunca se queixam mesmo não podendo dar beijos de língua.

Vou outra vez para o frio.


quinta-feira, 12 de janeiro de 2006

Time bomb VI

Espera que já te conto uma história...
"Blonde waiting" Roy Liechtenstein - 1964

Vem daqui

a sua esposa receberá instruções que deverá cumprir à risca. Ao jantar deverá misturar o conteúdo de uma cápsula na sua bebida (claro que será inofensivo para si), e ela estará convencida que o vai adormecer.

Vai arranjar uma forma de você a acompanhar e o senhor fingirá adormecer durante o trajecto. Uma vez no local, ela deverá retirá-lo do carro e deixá-lo lá. No plano que lhe demos alguém tratará de si.

Quando ela o tirar do carro você acorda e dá-lhe um tiro, ou dois, depende da dose de raiva, e depois livra-se do corpo.

- Tiro, livrar do corpo? Espero que isso também esteja no plano senão tenho que ir alugar o “Manual de crimes banais”.

- A arma é fornecida por nós que depois devolverá à procedência. O sítio para se livrar do embrulho fica a poucos metros do local do crime. É a zona de construção de uma auto-estrada. Há lá um vazadouro de inertes onde, todos os dias, são descarregadas toneladas de pedra e terra. A única coisa que tem a fazer é atirar o corpo para o vazadouro e cubri-lo com alguma terra. No dia seguinte, a partir das seis da manhã (quando ainda não há luz), gigantescos camiões vão verter terra fazendo com que nunca mais haja sinal da sua esposa.

- Maquiavel ao vosso lado é um anjo da guarda.

- Depois de vestir umas luvas, pega no carro e estará um carro à sua espera com um duplo da sua mulher que deverá acompanhá-lo a sua casa e entrar. A meio da noite a nossa agente sairá de sua casa com o carro da sua esposa e irá até ao aeroporto deixando-o no parque de estacionamento.

De seguida a nossa agente faz o check-in no voo para Buenos Aires com um passaporte falso em nome da sua esposa. Em Buenos Aires a identidade da sua esposa esfuma-se no ar.

24 horas depois do crime você liga à polícia e participa o desaparecimento. Vai ser interrogado pela PSP e pela Judiciária mas não se preocupe, nós vamos fornecer-lhe um guião, que deve estudar e queimar, com as perguntas possíveis e respectivas respostas.

Com o decorrer da investigação, a Judiciária descobre, através do cartão de crédito, que foi movimentada uma grande quantia de dinheiro para uma conta cifrada na Argentina e que foi comprado um bilhete de ida para Buenos Aires.

Desolado o inspector vai informá-lo que a sua esposa fugiu e se encontra em parte incerta na Argentina.

Fim...

quarta-feira, 11 de janeiro de 2006

Time bomb V


"Masterpiece" Roy Lichtenstein - 1962



- Temo que não me esteja a entender. Não vai ter que pagar nada, afinal o encomendador já o fez por si. Só queremos que seja você a fazer o serviço, não pedimos nada em troca.

O carro pára suavemente e o motorista, até agora invisível graças ao separador, revela-se e abre a porta.

- Faça o favor, diz-lhe o homem de fato.

- Estava à espera de um macaco de ginásio.

- Nós somos anti-estereótipo.

- Já deu para notar.

Uma floresta de salgueiros cercava uma casa em xisto. Olhando para trás, a única coisa que se via eram salgueiros e mais salgueiros, cortados pela estrada que conduzia à casa. Não se vislumbrava nenhuma luz a não ser a que vinha de uma janela, o que tornava difícil a identificação do local.

A porta de entrada, em carvalho, deu acesso a um corredor decorado com serigrafias numeradas de diferentes artistas, a julgar pelos rabiscos nas telas.

Conduzido pela figura esbelta da loira, chegam a uma sala com sofás de couro e uma lareira em xisto a ambientar. A cobrir grande parte das paredes quadros surrealistas que se tornavam vulgares pela quantidade.

- Estes quadros vêm mesmo a propósito. Escolheram-nos para esta noite?

- É para se sentir confortável. Ainda tentamos arranjar sarcásticos mas já estavam esgotados.

- Eu sei, estão todos em minha casa. São verdadeiros?

- São, fazem parte do nosso fundo. Temos que gastar o dinheiro em alguma coisa.

- Não tem por aí o retrato do Dorian Gray?

- Não, reza a lenda que o retrato se transformou em carne, mas isso já deve saber.

- Pois. Mas diga lá, continue a expor a sua proposta.

- Primeiro uma bebida. Jack Daniel’s, certo?

Tinha-se deslocado a uma mesa de apoio e voltava com dois copos quadrangular da marca do Tenessee.

- Sabe que este bourbon sabe a

- Banana, eu sei.

-?!

- Temos estudado os seus hábitos, gostos, leituras, tudo, por isso não se espante com o que possa acontecer.

Mas agora… Quero saber se aceita a nossa proposta.

- Desculpe. Eu nem sei quem é a pessoa em questão.

- A pessoa em questão é a sua esposa.

Os olhos dele brilharam de raiva e de satisfação e, sem pestanejar, entendeu que lhe tinha saído a lotaria. Era a melhor forma de se livrar daquela megera.

- O que é que tenho de fazer?

- Nós sabíamos que o senhor ia aceitar, afinal as coisas entre vocês não estão assim tão boas.

- Ai isso é que estão, eu quero é ver-me livre dela porque a amo.

A nota de ironia transparecia raiva e impaciência e, enquanto foi buscar a garrafa à mesa de apoio, acrescentou:

- Vamos lá despachar isto.

- O plano é o seguinte:

Continua...