sexta-feira, 9 de julho de 2004

Euforia

Euforia, a palavra certa para caracterizar o momento. Numa cidade onde se respira futebol, não é estranho o sentimento, mesmo neste Estranho que se tornava frio quando em contacto com as multidões. Estudioso das atitudes dos outros, achava que não se devia envolver, e que o seu espírito científico devia prevalecer sobre toda e qualquer forma de emoção.
Naquele momento tornava-se impossível, e sendo arrastado pela turba em movimento assíncrono, que inexoravelmente o conduzia para um destino incerto mas ao mesmo tempo desejado, pensava – que se lixe uma vezes não são vezes.
Gritou, abraçou, chorou, tropeçou e foi calcado, empurrado, esmagado, beliscado, apalpado e sentado num restaurante para o merecido repasto, da noite. Aí a Lentidão tomou conta da situação.
Um empregado abriu uma garrafa de Duas Quintas, deixou-a respirar durante meia hora, para condignamente ser beijada pelo amante dessa noite.

É esta a beleza do vinho, tem que ser tratado como uma mulher, com carinho, recheado de atenções especiais para poder ser condignamente apreciado. Toda uma série de pequenos quês que fazem toda a diferença. É sinónimo de classe saber como escolher um vinho e que tratamento lhe dar, porque a informação pode ser transferida para o trato com o sexo oposto, o único senão é que o vinho pode ser partilhado, o mesmo não deve ser feito com as mulheres.
Pediu pato assado no forno recheado com pinhões e amêndoas, prato lento, desde o tempero ao cozinhar, até à própria carne, tornam o prato lento e extremamente requintado como a maior parte das mulheres. Está visto que este parágrafo vai ser só sobre comida, bebida e... mulheres.
Sobremesa Jack Daniel’s e um Havana, tudo muito lento... e incómodo, como o silêncio e a solidão que estava a sentir.
Salta para a rua e é abordado - deixa-me adivinhar... por uma gaja? por uma rapariga, que sem papas na língua lhe dá a mão ternamente, revelando-lhe todas as loucuras e desejos deste mundo que o rodeia, pensando que conseguiria arrebatá-lo deste marasmo consciencialista-científico que o prendia ao quotidiano com as grilhetas frias, apertadas e lúgubres do auto-conservadorismo – tanta coisa para dizer que o gajo era chato comó caraças.
Chocado puxa de um cigarro e com raiva declama todas as dores que lhe oprimem o peito, fazendo ressurgir toda a impaciência e loucura dos seus tempos de adolescente. Sem medos envolve-a com a sua alma e percorre as ruas do desejo em espirais de êxtase - daqui a pouco pareces o Richard Bach, o do Fernão Capelo Gaivota. Sorrindo, beija-a como beijara o copo de vinho, e arrepia-se com a simplicidade do toque, do sabor, da magia de um simples tocar de dois lábios.
Ri-se e abstrai-se do mundo à volta e pensa... pensa em quê? há que pensar? Que lamechas que me saíste, a moça quer é acção, tudo bem que haja um pouco de romantismo, classe and so on, mas o que é demais é moléstia. CHATO! Não pensa, porque este momento não é para pensar, e´ para sentir, viver e não racionalizar, vive não penses, sente, depois olha para trás e não julgues, assimila. Mas fora isso, pelo menos tocaste-lhe no ponto, pelo menos foi mais que uns beijinhos?

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