Sou um vampiro. Anseio pelo sangue das pessoas. Invento mil e um estratagemas retorcidos para lhes roubar a essência da vida.
Dou por mim a vaguear na noite, ouço e sinto as pessoas a falar, farejo-as e observo com atenção todo e qualquer pormenor importante para a minha subsistência.
Saio do autocarro e sigo uma loiraça de 21 anos, que vinha a contar que ia fazer um escândalo com o gajo, quando chegasse à discoteca. Andou uns metros, olhou por cima do ombro, e senti a marosca descoberta. Furtivamente evaporei-me num salto felino, para trás de uma árvore, e sai logo a seguir a fechar a braguilha. Não fosse ela desconfiar das minhas intenções. Parece que não. Seguiu caminho. Segui-a e entrou no Tomate. Entrei também disfarçando um ar de habitué de sexta-feira à noite, à cata de uma mulher para levar para casa e aquecer-me os pés e outras coisas também embora com o síndroma de abstinência que me estava a roer, só a ideia de aquecer fosse o que fosse, me enojava. E com o que conhecia daquilo, jurara a mim próprio não fazer mais cenas tristes num local daqueles. Pensei nos engates de cotas que já se estavam a efectuar. Com nojo, pensei, que se todos fossem vampiros como eu, tudo seria melhor, e escusavam ter acções recriminadas por eles próprios. A composição da sociedade era a coisa mais estúpida e hipócrita que já senti a pesar sobre mim.
Pedi um Jack Daniels, e beberriquei, enquanto ia seguindo com os olhos, a loira deliciosa, que com um ar decidido, francamente duro, e sexy, procurava algo com o olhar, brilhante, semicerrado.
Não tardou e levou um apalpão de um quarentão de cabelo grisalho e ar de engatatão da feira da Vandoma, que se deslocou rapidamente ao Pedro Hispano, depois de ter chocado de frente com um copo de bourbon. Pedi outro Jack, e comecei a tratá-lo por você. Reparei que a loiraboacumóraioquehá-devirumdiadestesparameiluminar, continuava à procura da sua presa dessa noite. Amassada vezes sem conta até conseguir vislumbrar pelo canto do olho, o seu objectivo, sacou da sua side arm e cilindrou-o com uma bofetada que abafou a música. Ouvi-a claramente dizer que ele não tinha vergonha, que era um cafageste. Brasileirismo desnecessário. Acho que pulha estava mais adequado, ou até mesmo cabrão como que insinuasse que ele tinha um par extremamente retorcido de chifres, e que podia, porventura, pôr os boxers a secar num estendal providencialmente montado entre hastes.
Que não tinha o direito de lhe fazer aquilo, logo agora que ela era feliz. Que lhe roubara a esperança no amor. Como é que ela ia poder viver dali para a frente... saiu desesperada a chorar, e o vampiro do meu ego acordou.
Segui-a pela última vez e paguei atentamente a aglomerar todas as reacções da rapariga. Saí atrás dela e abordei-a com uma oferta de boleia. Que ela não estava nada bem, que se quisesse podia desabafar comigo. Muitos anos de experiência convenceram a rapariga a aceitar a simpatia.
Contou-me que namorava com a rapariga que estava com o seu melhor amigo, na marmelada na discoteca. Não fora ela que a traíra, mas sim ele que com a experiência de beto estúpido, achara aquilo um desafio e intrometera-se na sua relação. Agora dizia a plenos pulmões que conseguira comer uma fufa, e mantinha-a ao seu lado. Ganhara uma grade de cerveja e a admiração dos seus colegas de trunfa estúpida a cair sobre os olhos, bíceps horrorosamente deformados pelo culturismo, encaixilhados em pólos da Sacoor Brothers.
Deixe estar que são todos uns clones uns dos outros. E não se preocupe, há-de arranjar melhor. Pedi ao taxista que me levasse ao meu palacete na Foz, e levei-a para a varanda, que ela não estava em condições para ir já para casa. Sentei-me no meu cadeirão preferido, e preparei com cuidado o fim da partida.
No fundo não podia negar a minha natureza. Era um vampiro. Muito especial. Sugava todos os pormenores das pessoas. Era atraído por todos os pormenores sórdidos e interessantes da vida de cada ser humano, e convenhamos, os sórdidos são os mais interessantes. Ao longo dos anos desenvolvi um sexto sentido, que estava latente em mim, que me permitia julgar as pessoas e perceber onde estavam as histórias mais sui generis. A partir daí tornou-se um vício. Todas as noites tinha que sair de casa para curar a ressaca. Procurava uma pessoa, que escolhia criteriosamente, e deliciava-me a dissecar a história mais impressionante da vida dela. Sugava aquilo, com a sofreguidão de um naufrago morto de sede, rodeado de água salgada que não lhe serve de nada. Dia após dia, história após história ia sugando aquilo como se sangue fosse.
Muitas vidas vivem dentro de mim. Cada história que se interliga com as pré-existentes, e formam uma imbrincada teia de sentimentos, dores e felicidades...
Mas este caso... é diferente. Um desafio!
Falei-lhe ao ouvido. Disse-lhe que era uma mulher muito atraente. Fui buscar um Jack, deixando de parte as formalidades e voltando a tratá-lo por tu. Voltei a falar-lhe ao ouvido. Segredei-lhe qualquer coisa imperceptível até para mim, de tão baixo que foi dito. No entanto, ela percebeu-me perfeitamente.
No dia seguinte, juntei-me com os meus amigos, que me deram os parabéns na forma de uma grade de cerveja. Com as suas trunfas a cair sobre os olhos, perguntaram-me os pormenores...
Dou por mim a vaguear na noite, ouço e sinto as pessoas a falar, farejo-as e observo com atenção todo e qualquer pormenor importante para a minha subsistência.
Saio do autocarro e sigo uma loiraça de 21 anos, que vinha a contar que ia fazer um escândalo com o gajo, quando chegasse à discoteca. Andou uns metros, olhou por cima do ombro, e senti a marosca descoberta. Furtivamente evaporei-me num salto felino, para trás de uma árvore, e sai logo a seguir a fechar a braguilha. Não fosse ela desconfiar das minhas intenções. Parece que não. Seguiu caminho. Segui-a e entrou no Tomate. Entrei também disfarçando um ar de habitué de sexta-feira à noite, à cata de uma mulher para levar para casa e aquecer-me os pés e outras coisas também embora com o síndroma de abstinência que me estava a roer, só a ideia de aquecer fosse o que fosse, me enojava. E com o que conhecia daquilo, jurara a mim próprio não fazer mais cenas tristes num local daqueles. Pensei nos engates de cotas que já se estavam a efectuar. Com nojo, pensei, que se todos fossem vampiros como eu, tudo seria melhor, e escusavam ter acções recriminadas por eles próprios. A composição da sociedade era a coisa mais estúpida e hipócrita que já senti a pesar sobre mim.
Pedi um Jack Daniels, e beberriquei, enquanto ia seguindo com os olhos, a loira deliciosa, que com um ar decidido, francamente duro, e sexy, procurava algo com o olhar, brilhante, semicerrado.
Não tardou e levou um apalpão de um quarentão de cabelo grisalho e ar de engatatão da feira da Vandoma, que se deslocou rapidamente ao Pedro Hispano, depois de ter chocado de frente com um copo de bourbon. Pedi outro Jack, e comecei a tratá-lo por você. Reparei que a loiraboacumóraioquehá-devirumdiadestesparameiluminar, continuava à procura da sua presa dessa noite. Amassada vezes sem conta até conseguir vislumbrar pelo canto do olho, o seu objectivo, sacou da sua side arm e cilindrou-o com uma bofetada que abafou a música. Ouvi-a claramente dizer que ele não tinha vergonha, que era um cafageste. Brasileirismo desnecessário. Acho que pulha estava mais adequado, ou até mesmo cabrão como que insinuasse que ele tinha um par extremamente retorcido de chifres, e que podia, porventura, pôr os boxers a secar num estendal providencialmente montado entre hastes.
Que não tinha o direito de lhe fazer aquilo, logo agora que ela era feliz. Que lhe roubara a esperança no amor. Como é que ela ia poder viver dali para a frente... saiu desesperada a chorar, e o vampiro do meu ego acordou.
Segui-a pela última vez e paguei atentamente a aglomerar todas as reacções da rapariga. Saí atrás dela e abordei-a com uma oferta de boleia. Que ela não estava nada bem, que se quisesse podia desabafar comigo. Muitos anos de experiência convenceram a rapariga a aceitar a simpatia.
Contou-me que namorava com a rapariga que estava com o seu melhor amigo, na marmelada na discoteca. Não fora ela que a traíra, mas sim ele que com a experiência de beto estúpido, achara aquilo um desafio e intrometera-se na sua relação. Agora dizia a plenos pulmões que conseguira comer uma fufa, e mantinha-a ao seu lado. Ganhara uma grade de cerveja e a admiração dos seus colegas de trunfa estúpida a cair sobre os olhos, bíceps horrorosamente deformados pelo culturismo, encaixilhados em pólos da Sacoor Brothers.
Deixe estar que são todos uns clones uns dos outros. E não se preocupe, há-de arranjar melhor. Pedi ao taxista que me levasse ao meu palacete na Foz, e levei-a para a varanda, que ela não estava em condições para ir já para casa. Sentei-me no meu cadeirão preferido, e preparei com cuidado o fim da partida.
No fundo não podia negar a minha natureza. Era um vampiro. Muito especial. Sugava todos os pormenores das pessoas. Era atraído por todos os pormenores sórdidos e interessantes da vida de cada ser humano, e convenhamos, os sórdidos são os mais interessantes. Ao longo dos anos desenvolvi um sexto sentido, que estava latente em mim, que me permitia julgar as pessoas e perceber onde estavam as histórias mais sui generis. A partir daí tornou-se um vício. Todas as noites tinha que sair de casa para curar a ressaca. Procurava uma pessoa, que escolhia criteriosamente, e deliciava-me a dissecar a história mais impressionante da vida dela. Sugava aquilo, com a sofreguidão de um naufrago morto de sede, rodeado de água salgada que não lhe serve de nada. Dia após dia, história após história ia sugando aquilo como se sangue fosse.
Muitas vidas vivem dentro de mim. Cada história que se interliga com as pré-existentes, e formam uma imbrincada teia de sentimentos, dores e felicidades...
Mas este caso... é diferente. Um desafio!
Falei-lhe ao ouvido. Disse-lhe que era uma mulher muito atraente. Fui buscar um Jack, deixando de parte as formalidades e voltando a tratá-lo por tu. Voltei a falar-lhe ao ouvido. Segredei-lhe qualquer coisa imperceptível até para mim, de tão baixo que foi dito. No entanto, ela percebeu-me perfeitamente.
No dia seguinte, juntei-me com os meus amigos, que me deram os parabéns na forma de uma grade de cerveja. Com as suas trunfas a cair sobre os olhos, perguntaram-me os pormenores...
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