quinta-feira, 13 de outubro de 2005

Livro


Acorda num sítio muito estranho. Por muito que queira descrevê-lo não tem sucesso (satisfatório). No centro da divisão (acha) encontram-se duas estantes que devem ter dois metros e meio de altura. Tocam o tecto. Aí está colocada uma série de livros que devem contabilizar 450 volumes em cada face da estante (se bem que possa estar enganado), num total de 900 mais coisa menos coisa.

Todos os livros são diferentes em tamanho e cor, formando um arco-íris desordenado, uma manta de retalhos de cultura (assim julga). As formas, uma muralha de legos misturados com blocos de construção lógica infantis e meccano. Uma Babilónia lógica; tem que haver uma lógica nisto.

Quando se aproxima, o tecto transforma-se num gigantesco espelho, fazendo com que os livros se tornem numa gigantesca torre infinita. Todo o conhecimento está ali em reflexo.
Com mais atenção vê que os livros se invertem, como é natural num espelho, criando ilusão: os reflexos não correspondem à imagem original.

Olha em redor e toda a sala é um gigantesco e único espelho multiplicando os livros e a sua imagem até à exaustão. O medo acorda-lhe a mente. Tem que sair dali. Tacteia, bate com os nós dos dedos para sair, não para entrar, obtendo sempre o mesmo resultado, nada. Está preso.
Um sonho, espero estar num sonho maluco.

Dirige-se às estantes e retira o primeiro livro do topo esquerdo. Não tem título nem autor, mas sim, índice.
Ao que parece é um livro de Contos.

Absorto na leitura descobre, com espanto, que a sua história, desde que acordara na sala espelhada, está lá escrita, mas por alguma razão interrompida no ponto em que ele pega no livro.
Os contos acabam todos de uma forma que indica que o autor tem gosto em brincar com a vida das personagens que cria. Vai criando expectativas dando migalhas, semeando a confusão para, no final, os deixar com a vida destroçada ou com uma experência traumática que lhes mude a vida.

Pega numa esferográfica e resolve escrever.

15.00
Está sentado como é costume em frente ao computador. A sala é decorada com azulejos do Estado Novo; citações de Salazar e outros coevos da Ideologia.
Com a rotina no rato e a retina no monitor, liga o Messenger, o Morpheus e o Media player.; clica no Firefox e escreve
gmail.com
Durante trinta minutos consulta os mail's e troca algumas palavras com os habitués. Muda o estado para ocupado e escreve o post para o blog. 15 minutos de escrita, dez de correcções; google images para encontrar o quadro relativo ao texto; formata e publica.
Passa agora para a ronda pelos blogs habituais. O primeiro fá-lo esfregar os olhos, o segundo arregalá-los; vai clicando em pânico em todos e as mãos crispam-se sobre o rato com tanta força que um estalido revela que o partiu em vários fragmentos.
Confere a hora dos posts e comprova através das lágrimas de raiva que todos foram escritos antes do seu. Ele é a cópia, uma farsa. O seu texto estava em todos os blogs.

Ora toma lá que é para não andares a torturar as tuas personagens. Vê lá se gostas quando brincam contigo.

Acabara o livro do escritor deconhecido e nada o podia mudar. Esgotara o espaço para texto a tinta preta sobre o papel amarelo. Não havia correcção possível.
Com um sorriso nos lábios volta a colocar o livro na prateleira. Volta-se com um sentimento de justiça e, no espelho, vê tinta preta a escorrer pela lombada do livro.
Volta a segurá-lo e algumas letras estão a compor palavras lentamente na lombada.

O Livro e outros contos – Miguel de Terceleiros
Pega na carteira, como que duvidando da própria identidade, e os espelhos partem-se.
Ricardo Brochado AKA Miguel de Terceleiros

46 comentários:

noasfalto disse...

Cheira-me que vamos ter livro...
ABR

Hugo Brito disse...

Cheira-me que acabamos de ler Borges:D:D:D:D:D

Hugo Brito disse...

e que vamos ter livro;)

Miguel de Terceleiros disse...

Ainda não acabamos Borges, estamos no início. A ideia do livro hum... Agrada-me mas vamos com calma.
abraços para os dois.

armando s. sousa disse...

Aquilo que tenho visto, tanto tu como o HN, já deveriam ter pensado sériamente em editar um livro. A qualidade da vossa escrita é indiscutivelmente de grande qualidade. Sobre o Borges não receber o Nobel, é provavelmente a maior injustiça da Academia Sueca. Como português também acho que foi uma injustiça não o ter entregue a Miguel Torga.
Um abraço.

PR disse...

da próxima, podiamos trocar telemóveis...seria mais fácil

prometo mandar mensagens, já que estamos mais habituados a ler o que cada um escreve em vez de falar....

:-)






bem. boa sorte miguel.

SE PRECISARES DE UM PREFÁCIO, AVISA.

Anónimo disse...

"Volta-se com um sentimento de justiça e "
Expressão feliz em que se realça um estado que devia ser comum a todos.Mas nos tempos que correm ser injusto já é uma qualidade e não um defeito.
No cerne do tema há um efeito premonitório, que eu desejo se concretize: a feitura do livro!....
Abraço

mjm disse...

Ufa!...
Valeu a paragem e a demora.
Auguro-te sucesso, sabes?

Sukie disse...

Era realmente bom que lançasses um livro. Com as histórias que costumas escrever aqui, seria uma leitura muito interessante. Boa sorte!

Poor disse...

já sabes...:)

Anónimo disse...

Ficaste preso nos meus favoritos, e cada vez que teclo um “t”, cá estou eu...
Pena não ter olhos que cheguem para ler os teus textos todos...

Freddy disse...

Foto fálica...

Abraço da Zona Franca

Miguel de Terceleiros disse...

Armando: Qual é a editora que pega num maluco como eu!? :)

Pepe: Tu sabes que eu sei. Quem são esses quem?!

Ernesto: Podes começar a escrever o prefácio. ;)

Miguel de Terceleiros disse...

Adriano: A justiça nos dias de hoje é relativa. Podemos pugnar para a restaurar. Quanto ao livro é um desejo (secreto) shiu.

Mjm: um beijo e obrigado.

Moonj_rita: muito e muito obrigado. beijo.

Miguel de Terceleiros disse...

Anónimo(a): Fico contente por gostares, aliás feliz. Os meus leitores é que me inspiram na maior parte das vezes. Para a próxima uma assinatura, se não for pedir muito.

Freddy: Muito fálica indeed. Já agora, estás a falar do marco geodésico ou da minha cabeça?

Miguel de Terceleiros disse...

Amie: Tu também sabes.

Anónimo disse...

Não estou no anonimato para me esconder...
Por agora, quero apenas estar aqui, no meu sossegadinho cantinho...

Escreve-me :)... se precisares de dar vida ao teu livro no mundo das figuras!!!

Bom fim de Semana

Miguel de Terceleiros disse...

Anónimo(a): Não digo que te estejas a esconder.
Peço uma assinatura para poder saber se é sempre o mesmo anónimo :).
Posso escrever-te a tinta ou a caracteres, como preferes?!
Desenhar a tua imagem com letras.
Posso:
idealizar;
infra-idealizar;
supra idealizar...
Qual o teu tipo de idealização perfeita?

noasfalto disse...

Livro! Livro! Livro! Livroooooooo!

Editora para quê? Faz em casa ò preguiçoso!

Na escolinha não aprendemos a encardenar??? Queres melhor altura para praticar, volvidos XX anos?

noasfalto disse...

E de Borla!!!!
Yupiiiiiiii!!!

noasfalto disse...

E se for fraco (não acredito) voltamos à FOGUEIRA!!!!!

noasfalto disse...

Sou chato não sou? Já me conheces...

Miguel de Terceleiros disse...

No Asfalto: Index para cima de mim?!
Indexas-me?!

noasfalto disse...

Bien sure

noasfalto disse...

Olha: vai ao meu blog que tem lá uma fotografia pra ti, ò preguiçoso!

Anónimo disse...

Para alem de ser amante das tintas, prefiro que me escrevas em carácter. É mais rápido e indolor...

A imaginação é perfeita...dá-me tu um nome!!

Miguel de Terceleiros disse...

Anónimo(a): Seja, caracter será.
(é andrógino)
Nunca se soube se era realmente uma mulher ou se era a cara do Leonardo por isso como não sei o teu sexo ficas Mona Lisa.
Para além disso aquela aura de mistério...
agrada-me.

Miguel de Terceleiros disse...

Mona Lisa. pinta-me manda a cor por mail.
Miguelterceleiros@gmail.com
A moeda tem sempre duas faces.
Pode ser com pincéis de photoshop.

Anónimo disse...

Título muito sugestivo! Para levar em frente!
Avante Camarada!

Freddy disse...

Claro q era a cabeça... ;)

Anónimo disse...

:D

Cláudia Rocha Gonçalves disse...

era eu...

Fabulosa disse...

cm é q eles dizem? é "fazer um filho, plantar uma árvore, escrever um livro"?
eu quero ver se planto uma árvore. qt a ti... ñ sei se já tens filhos, se plantaste uma árvore, mas já tens uma fila de espera p/ comprar o teu livro! =)

Miguel de Terceleiros disse...

Galecius: Seremos a muralha de aço.

Freddy: Fálico eu?! Fálico?

Guevara: :D

Teoriazita: Filhos nem vê-los; árvores quando era puto no dia das ditas; Livro... Vamos ver.

mfc disse...

Um conto rodopiante entre o imaginário e o real e muito bem construído.

Anónimo disse...

maninho!!! é so pra dizer que concordo inteiramente com o resto do pessoal ue comentou este último post. o teu trabalho continua a melhorar, e a história é a piéce de resistence do blog, apesar de não a tua obra-prima.mas eu ainda tenho que escarafunchar um bocado no "atulhamento" pra poder falar... vou manter um olho em ti!! e vê lá se me guardas um exemplar da primeira edição, sim?? =)

beijo grande da tua maninha!
morwen

Anónimo disse...

Tu és da cor da folha da arvore outonal, da lua e do sol. Da chuva e da noite.
Tinta fresca que vai secando na tela rabiscada por ti próprio.
Afinal não somos todos assim?!

Sim... o mistério muitas vezes é o que nos guia na imaginação...
Já ouviste falar do monte da lua?

hmscroius disse...

Estás a sair do armário. Boa postada meu. Abraço.

Miguel de Terceleiros disse...

Morwen: é sempre bom saber que somos acompanhadospelo clã.
Um dia gostava que o os nossos demiurgos também dessem uma vista de olhos ao que para aqui está escrito.
Continua a escarafunchar e acima de tudo dentro de ti, que o talento também o tens.
Beijos

Miguel de Terceleiros disse...

Mona Lisa: Monte da Lua?! Gostava de conhecer.
Boa pintura a tua, é
Impressionismo?

Miguel de Terceleiros disse...

Dr. Croius: Armário... Um dia temso que sair, mas a porta já está entreaberta há muito tempo.

Miguel de Terceleiros disse...

Mfc: muito obrigado.

Anónimo disse...

É abstracção do ser humano para representar imagens :D

O monte da lua é o nome que designa a uma Serra... Onde lutaram Mouros e cristão... e viveram reis e rainhas... onde existem duendes mágicos e mouras encantadas a espera do derradeiro beijo. É onde existem castelos protegidos por gárgulas que acordam do sono profundo com o brilho da lua...
O monte da lua é envolto num mistério fantástico e poucos são aqueles que se aventuram a andar por lá depois do sol posto.

É o cenário perfeito para um dos teus contos...

Se quiseres, mais tarde envio-te imagens... e som...

Miguel de Terceleiros disse...

Mona Lisa:

O Monte da Lua onde a Pena é mais forte que a Espada?!
Palácios e castelos ameados... já passeei por lá numa outra vida mas morri pelos olhos de uma encantada.
Manda o reflexo de um espelho, as imagens em anagrama lógico.
beijo

kiko disse...

Cheira-me que o menú tem pratos diferentes do habitual! Cheira-me a ideia interessante e a possibilidade, caso queiras! Chiera-me a desconcerto, o que me parece bem, cheira-me bem, são rosas senhor, são rosas!!! ;) Ainda me doi o braço boi, da trinca!!!!

Raquel Vasconcelos disse...

"Confere a hora dos posts e comprova através das lágrimas de raiva que todos foram escritos antes do seu. Ele é a cópia, uma farsa. O seu texto estava em todos os blogs.
Ora toma lá que é para não andares a torturar as tuas personagens. Vê lá se gostas quando brincam contigo."


É terrível a sensação... por vezes dá vontade de dizer m**** para que gasto o meu tempo!