quarta-feira, 3 de agosto de 2005

Deus




Um rapaz de vinte e nove anos decidiu que não ia acabar o seu curso universitário para se dedicar a uma coisa mais terra a terra. Mudou-se com os seus livros para o Alentejo e comprou um monte isolado de tudo e todos.

Começou a plantar formigas. Com paciência e sabedoria aprendida nos livros começou aos poucos a construir a sua pequena colónia. Com uma rainha que parecia ter sido educada em Eton, criou uma sociedade produtiva que não lhe dava alimento ao corpo, mas uma enorme sensação de poder. Ter o poder sobre uma colónia de seres que são capazes de carregar cerca de oito vezes o seu próprio peso, mina-nos por dentro.

Sentava-se e observava a acção dos pequenos seres. Um dia acordou com uma ideia que não lhe saia da cabeça.

Foi até à colónia com um instrumento que tinha fabricado a partir de uma pua, na forja improvisada no celeiro, começou a criar túneis alternativos àqueles que eram minados pelas formigas.

Passados três dias concluiu a arquitectura auxiliar formiguesca e dormiu descansado, sentindo ter ajudado os pequenos seres na expansão do seu território subterrâneo.

No dia seguinte, com horror, descobriu que os túneis criados tinham sido invadidos por outra espécie de formigas, maiores e mais fortes que estavam a matar todas aquelas que considerava como suas.

Percebeu que cometera um erro e que já não havia forma de o reparar. Mexera com o livre arbítrio das formigas e conseguira que elas fossem destruídas.

O maquiavelismo começou a entranhar-se nas suas sinapses. Reformulou o instrumento que provocara a morte das formigas semeadas e construiu novos túneis que foram invadidos por formigas maiores que devoraram as formigas residentes.

Um dia, durante o dia, com toda a luz diurna que lhe cegava a alma, a casa foi invadida por gigantescas formigas brancas que o cobriram e devoraram o corpo durante muitos dias até ao Fim.

11 comentários:

Hugo Brito disse...

E foi assim, o fim do deus.

Anónimo disse...

Eu não existo.

Humor Negro disse...

Kafka, versão século XXI

Hugo Brito disse...

É, ou não, um local neutrão?

A vantagem de um vector (como diria o Santiago, Pepe) em que as partículas que o compõem não estão animadas, é que o esforço que exercermos sobre esse ponto será mais eficaz. Tivessem as partículas animadas e o esforço seria inútil porque a base de sustentação tornr-se-ia, naturalmente, móvel.

O "grupo" de amigos é algo que existe em quase todas as existências felizardas, serve para abrir o portal que separa dois compartimentos, aquele onde guardamos a roupa e o outro onde a vestimos. Volta-se sempre ao armário.

O Zooropa era o mundo com 20% de alterações. As das pupilas, que são alunas, sempre imperfeitas, das imagens.

Não há um dia. É tudo um longo documento, desunhe-se.:)

MIN disse...

Ai que horror!!!

Miguel de Terceleiros disse...

Hugo: sabe Quem sabe.

Deus: tens a certeza?!

Voudaquiparaali: Há sempre uma altura para mudar

Humor: obrigado pelo elogio.

Miguel de Terceleiros disse...

Di-dot: bem vinda. leio muitas vezes o que escreves e gosto, em contrapartida nunca vi as tuas imagens.
tenta.

Miguel de Terceleiros disse...

Hugo: para mim é sempre um local protão, siempre positivo nunca negativo, daí o estado de espírito.

Min: depende como olhas. É diferente olhar para as formigas se formos homens ou formigas maiores.

hmscroius disse...

É interessante a relação entre o tétrico e a prosa à la Marquez, com as formigas e tudo. Há aqui um certo fim de um ciclo ou a parte autobiográfica è metafórica?

Miguel de Terceleiros disse...

Di-Dot:Nõa me parece que sjas moldável, mas isso é tão realtivo como as imagens tentarem ou serem tentadoras, é uma questão que fica na cabeça de quem está do outro lado.
obrigado

Miguel de Terceleiros disse...

Dr. Croius: Pode-se dizer que há um fim de um ciclo mas também pode ser o retorno aum ciclo antigo. Sim a metáfora lá está mas duvido que haja autobiografia. Que Acha?!
abraço