"Guernica" Pablo Picasso - 1937
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Já fora subentendido que esta família não era propriamente abastada, e a bem da verdade classificar-se-ia como remediada.
Todos os brinquedos que alguma vez teriam, seriam na sua maioria, um remediado sucedâneo dos brinquedos das crianças com quem se relacionavam. Esclareça-se também que, no Natal, eram presenteados, com um sacrifício extra dos progenitores e restante família, com brinquedos fora de série, que automaticamente eram desmontados, dada a curiosidade latente no cérebro dos jovens, em perceber como funcionavam aquelas maquinetas fascinantes.
É lógico que depois de perdidas algumas peças os objectos deixavam de ter a funcionalidade para que tinham sido concebidos. Eram então refeitos de uma forma algo cubista-minimalista e utilizados noutras tarefas, coadjuvando os brinquedos preferidos dos terríveis irmãos, preferencialmente artesanais.
Latas de sardinhas ganhavam portas, com uma tesoura de poda, e transformavam-se em carros que futuristicamente deslizavam em vez de rodar. Os homenzinhos surgiam na forma de caricas que eram fervorosamente catadas junto ao café mais próximo por entre borras de café, sacos de açúcar vazios e outras coisas que não convém descrever ao pormenor.
Com pregos e pedaços de madeira faziam-se tanques com múltiplos canhões, criando toda uma parafernália marcial que era exaustivamente discutida e regida pelo Estado Maior do Exército de Babel.
Cascas de pinheiro, habilmente escavadas com as facas de cozinha, que não raramente apareciam com os bicos partidos, transformavam-se em barcos de todas as formas e feitios, porta-aviões sem aviões, corvetas, fragatas e todos os nomes que iam aprendendo relativos à realidade naval, com a vantagem de flutuarem realmente e nunca se afundarem por muita pedrada que levassem. Com o crescimento veio a mudança de brincadeiras, com os índios e cowboys.
As espingardas eram troços de couve, que também funcionavam como sticks de hóquei; arcos feitos com mimosas e fio de pesca surripiado ao pai; lanças com os arejões que estacavam os tomateiros de um cada vez mais raivoso pai; penachos com fio de lã roubado à mãe e penas roubadas às galinhas, que muito ofendidas não paravam de cacarejar; e os lenços dos cowboys tirados à socapa do roupeiro do avó, que passava dias intermináveis com o mesmo lenço de assoar.
A imaginação dava para tudo. Cartografaram toda a rede de canalização de água das redondezas, como forma de reconhecimento técnico-táctico, para as mini-manobras militares a que se dedicavam no intervalo das actividades de faroestianos, sendo também sobremaneira úteis quando resolveram tornar-se ecologistas desmontando as armadilhas dos rivais do Lugar de Cima, que tinham como objectivo apanhar coelhos, raposas, texugos e afins.
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7 comentários:
Algumas das coisas aqui descritas foram praticadas por mim quando miúdo. Até me deixaste com saudades daqueles tempos.
Como sempre o texto é superiormente escavacado.
Um abraço.
E os vimes? Têm propriedades elásticas impecáveis:)
até nos meus filhos eu já noto diferenças ENORMES nas brincadeiras...que saudades
Eu já sou da era do plastico.
Em que os brinquedos chegavam embalados em caixas muito atractivas.
Mas o "faça você mesmo" e os brinquedos "artesanais" também estiveram presentes na minha, não muito distante, infância. Certamente não tão presentes como em gerações anteriores mas uma caixa vazia, por exemplo, dava para algumas horas de entertenimento.
Dias belos e suaves esses.
Eu estive em Gernika (eheh) VOLTEI!
BAHHAAAAA! Adorei os brinquedos!!!
BJs
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